AS FALTAS DA DONA MALVINA

sexta-feira – 19/fevereiro
     O processo de estrangulamento do serviço público se dá por realizações de carências operacionais por falta de pessoal, carências que constituem verdadeiros torniquetes que vão sendo apertados até que todos clamem por uma terceirização de cada segmento específico das atividades públicas. É o caso do pessoal da limpeza de escritórios/banheiros/etc. e dos contínuos das repartições; tanto que já estamos todos pedindo “por amor de Deus” que terceirizem estes serviços.
      Hoje a Dona Malvina, que é uma raridade, pois faz muito bem este serviço de limpeza na Divisão de Manutenção, nos mostrou indignada o processo em que requereu abono de três dias de faltas ao trabalho ocorridas por “razões de força maior” e que foi indeferido. Contagiado pela sua indignação com os novos procedimentos administrativos, em que predomina uma burocracia que possibilita que pessoas se omitam de tomar decisões, se escondendo atrás de regras generalizadoras padronizadas e nem sempre compatíveis com a vida real, me propus a ouvir detalhadamente os seus motivos e elaborei o seguinte texto em seu nome para que ela anexasse ao processo requerendo uma reconsideração daquele despacho:

À DVH
     Tomei conhecimento do parecer indeferindo o meu requerimento baseando-se em argumentos burocráticos sobre prazos e regras legislativas, sem entrar no mérito da questão, motivo pelo qual não concordo e apresento um RECURSO conforme segue:
     Os três dias de ausência ao serviço foram motivados pelo fato da minha filha ter baixado às pressas na maternidade por estar grávida de 8 meses e, por complicações clínicas, teve que ser submetida a uma cirurgia cesária, dando origem a um parto prematuro. A gravidade do quadro pode ser avaliada pelo fato do recém-nascido ter ficado na UTI por cerca de trinta dias, e a mãe do nenê, por já ter quarenta anos e constituir um grupo de risco, ter ficado hospitalizada por cinco dias.
     Foi no meio daqueles dias que foram de acompanhamento, expectativas e até rezas durante dias e noites, devido à grande aflição familiar, que após comunicar por telefone os motivos da minha ausência ao meu EQAD, fui orientada para regularizar a minha ausência ao trabalho junto ao Gabinete Médico. Na ocasião compareci e expliquei o meu caso ao próprio médico da Perícia Médica, o Dr. Renato Ferreira (que é um estranho novato que destoa da seleta equipe médica do GM), informando que a médica da minha filha forneceria um atestado, o qual falou que eu já havia perdido o prazo hábil e que deveria entrar com um processo quando tivesse o tal atestado.
     Como pode se constatar na minha ficha de Qualificação Básica em anexo ao presente processo, não consta em toda a minha vida funcional nenhuma falta ao serviço, e isto que eu já possuo todas as exigências para me aposentar no momento que quiser. Esperava que este meu histórico de dedicação profissional orientasse a burocracia do DMAE quando entrei com o presente requerimento, que pelo menos eu fosse ouvida antes de enviarem a sentença para ser publicada no DOPA, o que lamentavelmente não aconteceu com o parecer da Equipe de Apoio Técnico-profissional, o qual em considero injusto e peço reconsideração.
     Peço reconsideração por considerar falho o argumento do parecer que diz que “a servidora não se apresentou à Perícia e o que o médico informa que na situação médica apresentada o paciente pode ou não necessitar de acompanhamento familiar, impossibilitando a verificação da concessão ou não de Licença por Motivo de Doença em Pessoa da Família”.
     Sou classificada como operária, e em nenhum momento deste procedimento fui orientada, e deve haver um “Serviço Social” no DMAE para isso, no sentido de que deveria requerer Licença por Motivo de Doença em Pessoa da Família. A única orientação que recebi, como já relatei, é que deveria entrar com um processo anexando o atestado médico requerendo o abono das “ausências”. Além de ser inverídica a alegação que eu não compareci na Perícia, o parecer se baseia na resposta genérica e sem conhecimento de causa do médico da Perícia, simplesmente ignorando o atestado anexo da Drª Suzane C. Matte, que estava atendendo o caso no Hospital Divina Providência, e que afirma com conhecimento de causa que “a paciente necessita de cuidados e acompanhamentos nos dias 25, 26 e 27 de novembro/2009”.
     Como a própria existência deste processo se deve ao fato de não ter-se cumprido os prazos e regras burocráticas, o seu indeferimento argumentando estas mesmas causas, sem entrar no mérito do caso humano e de suas necessidades e urgências, bem como de suas decorrentes priorizações e atrapalhações, é o mesmo que tornar nula qualquer possibilidade de requerimento de “abono de faltas” por estes motivos.
     Portanto, solicito RECONSIDERAÇÃO DO PARECER Nº 412/2009 motivado, não pelos prejuízos financeiros decorrentes, mas por não achar justo que a minha ficha funcional fique “suja” com estas três faltas ao final da minha carreira profissional*.
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* = Toda esta luta para uma servidora com trinta e tantos ano de serviços prestados à empresa obter três dias de abono no cartão ponto e notoriamente por razões nobres. Coisa que a chefia imediata fazia, antigamente, sem o kafkiano “processo” burocrático atual. E ainda tem muita gente querendo dourar a pílula do “mundo do trabalho” em serviço público como sendo um paraíso e não uma prisão...
**= Três meses depois de apresentado este recurso, ainda não houve uma decisão sobre o caso.

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