REFLEXÕES SOBRE ESTRATÉGIAS DE PRÉ-APOSENTADORIA

(Guilherme (E), Sady Raposão (C) e Paulo Chatinho (D), aposentados da década de 90 e 2000 na DVM)

           Há várias estratégias consagradas de como se migrar da ativa para a aposentadoria, todas desenvolvidas intuitivamente por cada um, conforme suas peculiaridades pessoais.
            Uma estratégia muito comum é a dos que acumulam Licenças Prêmios (LPs) por muitos anos para as usarem no final da carreira. Um caso extremo deste perfil típico foi o do Seu Joãozinho da DVA, que foi trabalhando até o último dia, ao fazer 70 anos caiu na compulsória sem tirar as suas várias LPs acumuladas. Depois, magoado por ser mandado embora por força da lei, solicitou que pelo menos suas LPs fossem “compradas” pela Administração, como uma forma de reconhecimento e compensação à sua vida dedicada quase que integralmente ao DMAE. Não levou nada, suas LPs foram perdidas.

(Com excessão do Jorge Cafú, todos os demais  do time da EME estão aposentados ou mortos)

Há, no meu ver, várias problemáticas nesta estratégia de acumular LPs. A primeira problemática é o próprio perfil de quem não goza LPs por vários anos seguidos, pois é um forte indicativo de se tratar de alguém dependente do meio ambiente profissional e que não encontra o que fazer, quando fica por muito tempo fora do trabalho.
(Engº Valmor, aposentado da década de 80 na DVM)

         Alguns adotam a tática de usufruírem de todas as LPs emendadas  no período imediatamente anterior ao da aposentadoria, como uma forma de antecipá-la. Esta é uma prática bem comum e se constitui numa cultura desenvolvida em função do pessoal ter ficado sempre na expectativa de que num “belo dia” a Prefeitura voltaria a “comprar” as LPs, o que há décadas não acontece. Significa dizer que muitos colegas acumularam várias LPs que podem totalizar até um ano ou mais de licença para gozarem. Uma variável deste procedimento é, ao invés do gozar todas LPs  de forma consecutiva, preferirem a estratégia de usufruí-las em meses alternados: trabalhar um mês e folgar outro, ou folgar dois, etc.
(Engº Nerci, aposentado da década de 90 na DVM)

Uma problemática destas estratégias de “batida em retirada” do trabalho, é que há o risco de se ficar numa situação funcional fragilizada, ficando sujeito inclusive a ser hostilizado por alguns colegas (por não sermos nem uma coisa nem outra – nem se está aposentado e nem se está mais desenvolvendo  plenamente as atividades, as quais passam a sobrecarregar os outros), e risco de ser prejudicado por uma chefia adversa por ter deixado de exercer atividades que garantiam benefícios como gratificações tributárias, insalubridade, incentivo técnico, etc. É, portanto, uma tática de alto risco às vésperas de se levar tudo para sempre no soldo de aposentado!
(Nelci (E) e Ranir (D) se aposentando na década de 90, com o Gato no fundo (E) que morreu em 2009)

Há uma outra variável desta mesma estratégia de LPs acumuladas, que foi a adotada pelo ex-colega Jalba, qual seja, de gozar dois ou três meses consecutivos, ao longo do ano anterior ao da data prevista de “baixa do quartel dos barnabés”, para servir como um ensaio prático da vivência de aposentado; guardando apenas um mês de LP para usar quando entrar efetivamente com o pedido de aposentadoria no PREVIMPA.
(Luiz Antônio, o Boca de Cinzeiro, aposentado em 2009 na DVM)

A minha estratégia, porém, tem sido sempre de gozar as LPs anualmente, gozando-as por trinta ou quinze dias como férias de inverno, de forma que se acabe uma LP quando já vou adquirir a próxima, sem jamais deixar acumular LPs. Assim, por uma lado fiquei limitado, pois não teria como antecipar nem como ensaiar a minha aposentadoria ficando vários meses em casa; porém, por outro lado, fiquei livre para sair a qualquer momento a partir de 28/julho, se alguma situação de “alto risco” surgisse, sem correr o risco de ter que abrir mão de LPs acumuladas, se me deparasse diante da necessidade de uma saída de emergência.

(Rudnei, o Pirata,que se aposentou no final de 2010 na DVM)

É preciso que se registre que estamos vivendo tempos conturbados de desconstrução dos chamados “direitos adquiridos” (Tarso Genro, quando Ministro da Justiça, já disse que não existe direito adquirido!).
O meu planejamento inicial, registrado aqui neste blog, era de que sairia de férias no início de fevereiro de 2011(confirmado dia 03!). Por este cronograma, eu não voltaria mais a trabalhar depois de entrar em férias, por protocolaria o meu pedido de aposentadoria no primeiro dia do retorno das férias e emendaria uma licença prêmio em março, para ficar na Licença Aguardando Aposentadoria. A partir de 1º abril estaria aguardando a oficialização da aposentadoria em casa, definitivamente sem retorno...

(Hélio Azeitona, aposentado da década de 80 na DVM)

Mas o tal Abono Permanência (11% de acréscimo no salário) pesa, é um anzol que está fisgando todo mundo que está meio atrapalhado financeiramente. E quem não está, não é mesmo? Especialmente no retorno das férias, quando sempre volto completamente falido, sem grana, operando no negativo do cartão e pagando juros. Normalmente só consigo me reabilitar com a restituição do Imposto de Renda (no primeiro lote!)...ou com a antecipação da restituição na rede bancária....

(O Hugo  Meleiro  (E), o primeiro da DVM a se aposentar em 2011!) 

Assim, como cada um sabe onde o sapato lhe aperta, não há uma estratégia melhor do que a outra, você é quem decide qual será a sua estratégia pré-aposentadoria e o momento certo de saltar fora. No meu caso, daqui pra frente, após pagar a última parcela do financiamento do carro no contracheque de fevereiro, nada mais está previamente definido, apenas está certo que volto para trabalhar o mês de março inteiro. Pra diante vou avaliar mês a mês: com cuidado para não sair correndo e cambaleando por falta de dinheiro, mas não tão cuidadoso para não cair na cilada de ficar trabalhando 8 horas por dia por menos de 10% do meu salário! Meu “Sonho de Liberdade” é outro...

A LUTA DE CLASSES DOS MUNICIPÁRIOS

A Revista da ASTEC, edição de dezembro/2010, coloca em seu editorial a necessidade da associação rever seus caminhos que se norteavam pela unidade dos técnicos científicos, para poder responder ao novo desafio, que são os movimentos profissionais particularizados dentro dos municipários portoalegrenses.  Por deliberação de Assembléia Geral, a ASTEC ficou na saia justa de apoiar esses movimentos organizados e, paradoxalmente, lutar pela conquista da isonomia salarial dos técnicos científicos.
         No Feirão da PMPA de reivindicações profissionais particularizadas, tem banca dos engenheiros, dos arquitetos, dos assistentes sociais, dos administradores, da gestão, dos médicos, dos advogados e dos fazendários!
       Os Assistentes Sociais buscam o cumprimento da jornada de trabalho de 30 horas semanais para a categoria, sem redução de salário, conforme lei federal.
       Os Procuradores  e Advogados conquistaram o ganho de 3,5 salários básicos, além dos salários comum a todos os técnicos científicos, para exercerem as mesmas funções  que sempre exerceram, a título de gratificação especial. Agora, no comecinho de 2011, ainda conseguiram que a Prefeitura pague a anuidade de seus respectivos órgãos de classe, no caso OAB, requisito exigido para que todos os técnicos científicos possam exercer a função para as quais foram concursados. Aos outros profissionais, médicos, engenheiros, etc, nada! A partir  destes movimentos, a ideologia instituída é a luta de todos contra todos os outros que não são de sua mesma classe profissional.
A propósito deste tema, postei um texto neste blog no mês de maio sobre o título:

A Luta de Classes: ASTEC X SIMPA
http://celsol-diariodeumaposentando.blogspot.com/2010_05_01_archive.html

         Onde eu dizia em março de 2010: Esta semana haverá uma solenidade promovida pelo Prefeito com a ASTEC (Assoc. dos Técnicos Científicos), para a assinatura de concessão da chamada “Integralidade da GIT” - Gratificação de Incentivo Técnico - que até agora atingia o valor de 90% do salário básico do cargo inicial de Nível Superior. A partir de fevereiro/2010 passará a ser dado a integralidade (mais 10% para integrar os 100%) como um “cala a boca” para não chiarmos contra os 2,5 salários básicos ganhos recentemente pela classe dos advogados da Prefeitura e, também, para esquecermos dos Procuradores e Agente Fiscais que já ganham 3,5 salário básicos como gratificações especiais. É como diz o velho ditado: de penduricalho em penduricalho vamos engordando o nosso salário!
       Com o surgimento da ASTEC (com todo o respeito aos seus mentores que acumularam o mérito da conquista da GIT) foi decretado que “o sonho de unidade no SIMPA acabou”. Eu não aderi à ASTEC na época, mas agora dei o braço a torcer e me associei, em dezembro/2010, só pelo interesse de manter um canal de contato com a categoria quando eu estiver “inativo”, para não ficar no ostracismo, já que o sindicato ficou muito partidarizado e deixou  o vazio de representativade para que os sindicatos de cada categoria profissional penetrassem para fomentar cada vez mais esta luta de todos contra todos nos municipários.
Durante todo o ano de 2010 me dei ao trabalho de ir recolhendo e guardando notícias sobre a fragmentação classista dos municipários portoalegrenses, enquanto acompanhava o movimento dos Capacetes Brancos que vem aglutinando os engenheiros em “capacetaços” e assembléias:
Prefeitura e Sindicato Médico firmam acordo inédito
        O Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) definiram em agosto de 2010, um protocolo de entendimento para o pagamento de abono salarial e criação do Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos (PCCV) para médicos do SUS da Capital. O prefeito José Fortunati e a vice-presidente do sindicato, Maria Rita Assis Brasil, assinaram o documento.
        O acordo prevê a elaboração de um projeto de Lei a ser encaminhado ao Legislativo, ainda em 2010, visando à instituição de um Plano de Carreira, Cargos e Vencimentos (PCCV) para os médicos do município. Na ocasião, também foi assinada a concessão de abono mensal de R$ 500, em caráter emergencial, retroativo a maio de 2010. Segundo Fortunati, o valor garante que a prefeitura possa realizar o pagamento, ao mesmo tempo que reduz a defasagem existente entre os médicos e os técnicos científicos.
         Hoje, porém, em janeiro de 2011, as manchetes dos jornais dão conta de um rompimento neste pacto, melando o Plano de Carreira especial para os médicos:
Impasse pela saúde na Capital
          O projeto da Prefeitura de Porto Alegre de criar uma entidade para gerenciar a rede de saúde pública deve ser motivo de debates acalorados no Fórum "Não à Fundação",  na Câmara de Vereadores. A implementação do Instituto Municipal da Estratégia da Saúde da Família, segundo Fortunati,  teria o objetivo de solucionar gargalos do atendimento na Capital. Para o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), que encabeça as críticas ao projeto, a fundação seria apenas mais um método de apadrinhamento político. Fortunati disse que “médicos se aproveitam da estabilidade para não trabalhar”. As críticas foram emitidas num contexto em que o prefeito anunciava o rompimento de relações com o Simers, acusando os médicos da Prefeitura de não cumprirem o horário contratado. Fedeu!...

 Verba de Responsabilidade Técnica

         Enquanto isso, diz uma nota do SENGE-RS:
         Caros Colegas, ao findar do ano de 2010, celebramos uma conquista inédita na história da PMPA: a união dos profissionais de engenharia, arquitetura, geologia e geografia. Um ano que termina vitorioso no sentido de que a maioria absoluta dos profissionais CREA da PMPA uniu-se em torno de uma causa comum: a valorização das carreiras da área tecnológica.
          Sempre soubemos que as conquistas não costumam vir com facilidade, os avanços não vêm de cima, precisam ser forjados dentro de um espírito de auto-valorização dos profissionais, algo que nas nossas profissões sempre foi um tabu, e que estamos, com todo carinho, modificando.
          Conseguimos iniciar um movimento com uma assembléia que contou com um quarto dos profissionais, em abril, ampliou-se significativamente ao longo do ano, com uma manifestação de 200 colegas em frente ao Paço, e encerrou o ano com uma assembléia contendo com a participação de aproximadamente 40% dos profissionais, em pleno horário de expediente. Conseguimos ser ouvidos pela administração e pelo próprio prefeito. Ainda não conseguimos a valorização e o respeito dessa mesma administração e desse mesmo prefeito, mas estamos trabalhando freneticamente para isso.
             Penso, enquanto um ex-sindicalista, que se  o Marx tivesse a premonição do que seriam as relações trabalhistas no século XXI, iria se revirar no caixão! A luta de classes é entre os próprios trabalhadores, de classe contra classe profissional. Nem Chico Xavier, com toda a sua mediunidade, conseguiria psicografar uma realidade dessas no Nosso Lar que é a Prefeitura Municipal de Porto Alegre.
            Com um barulho desses, para dormir sossegado só se aposentando e esperar  para curtir a copa alienadamente!

O RELÓGIO AUTOBIOGRÁFICO & NÓS, OS ENGENHEIROS

RISCOS DE VIDA E OS NOSSOS MORTOS
         Deu no jornal: ...três meses depois que o jovem Vavá morreu eletrocutado na parada de ônibus, o inquérito policial remetido à justiça indiciou por homicídio culposo oito pessoas. O indiciamento envolve três engenheiros e um eletricista de uma empresa terceirizada, contratada para a manutenção da rede pública de iluminação, e dois engenheiros e dois técnicos da prefeitura (SMOV e EPTC). Segundo a perícia do Departamento de Criminalística houve falta de fiscalização do serviço de manutenção, e houve omissão de providências após o recebimento de denúncias dos usuários sobre a ocorrência de choques elétricos na parada de ônibus. Segundo o laudo do delegado, Vavá não teria morrido se não ocorresse negligência
        Em nota oficial o Prefeito afirmou que não afastará os servidores indiciados, e que aguardará até a conclusão do inquérito da Comissão de Sindicância que avalia o caso para as tomadas de providências administrativas cabíveis.
       Os pais de Vavá receberam bem o resultado do inquérito policial e acreditam que a justiça está sendo feita.
       Esta tensão apreensiva decorrente da responsabilidade técnica dos engenheiros (e técnicos de grau médio) diante de acidentes fatais, me remonta para o caso do acidente...
O trecho acima é parte da matéria publicada neste blog em agosto:

          Mas antes de entrar na questão atual dos engenheiros, a propósito da matéria que publiquei aqui, na semana passada, sobre a implantação do Relógio Ponto Eletrônico no DMAE, percebi que ficaram alguma lacunas pertinentes sobre o assunto, as quais vale a pena resgatar, pois vem enriquecer os propósitos deste blog na perspectiva de um ”aposentaNdo” (com N maiúsculo!).
              Até meados da década de 90 todos nós assinávamos ponto autobiográfico na DVM. Nunca vi este tipo de relógio-ponto em algum outro lugar do DMAE, penso que é uma raridade jurássica exclusiva da manutenção e que a  maioria das pessoas não deve nem saber o que é isso. Pois eu explico: O ponto autobiográfico consiste num aparelho externamente semelhante ao relógio-ponto  de cartão tradicional, apenas que, ao invés de utilizar cartões  ponto individualizados, o aparelho é dotado de um rolo de uma fita de papel. Cabe esclarecer que dispomos de relógios-pontos tradicionais em dois modelos, os antigos, que são acionados manualmente por uma alavanca, e os modernos, que são acionados eletricamente quando penetrados pelo cartão-ponto.
           Pois o ponto biográfico é do tipo acionado manualmente, e quando o servidor abaixa a alavanca se abre uma portinhola metálica que permite acessar a um trecho da fita de papel onde o acionamento da alavanca  imprimiu o horário da “batida”,  e onde o servidor escreve a sua  rubrica com caneta e  o seu respectivo número de matrícula. Simples?... Complexo?...  Exótico?... Mas seguro, com certeza, contra “o mal do século passado” no mundo trabalhista, que é a falcatrua de um trabalhador presente bater o cartão-ponto de outro ausente.
        Todavia, o serviço de conferência do ponto nas fitas quilométricas extraídas deste aparelho biográfico era algo completamente insano. Imagine que o pessoal do administrativo (...o Alonço, depois, a Vanilda, e atualmente, o Rubem), para fechar o ponto de um único servidor no dia seguinte, teria que rodar aquelas fitas imensas e localizar as quatro rubricas de entrada e saída normais diárias e mais a entrada e a saída da hora-extra do dito cujo...É só fazer uma conta simples:  como o corpo funcional da DVM sempre foi de cerca de 150 funcionários, nas fitas de um dia tinha cerca de 600 rubricas (4x150) e mais, digamos que com 30 servidores em horas-extras por dia, 60 rubricas de serviços extraordinários (2x30); diariamente totaliza 660 rubricas escritas numa ordem de chegada aleatória na fita de papel dos registros biográficos do ponto.

             A racionalização deste serviço de controle do ponto, muito antes do advento do computador e do Excel, foi desenvolvida em uma gigantesca planilha que denominávamos o Jogo da Velha. Com os nomes dos funcionários na primeira coluna e  os dias do mês correspondendo às colunas seguintes, o Jogo da Velha consistia que o administrativo ia identificando cada rubrica sequencialmente na fita biográfica e marcando um traço na célula correspondente ao “servidor x dia do mês”, de modo que se aparecesse uma retângulo (quatro traços) o cara estava com o ponto cheio. Barbada, né? O problema mesmo era o cômputo das horas extras, isto eu nunca entendi direito e muito menos saberia explicar agora pra vocês.
        O correlato eletrônico do ponto biográfico mecânico é o prometido relógio biométrico, que é acionado mediante as impressões digitais de cada um, que não ficará mais sujeito às possíveis falsificações das rubricas biográficas ou do simples “um bater o ponto do outro”. Durante este período de transição em que estamos vivendo, foi desenvolvido o método voyeur de controles visuais de quem está batendo mais de um ponto, através da instalação de câmeras de televisionamento. Método este que não se mostrou eficiente para este fim, talvez seja útil para fins de segurança...ou de bisbilhotagem da vida dos membros da grande casa do BigBrotherDmae...ou outras questões  próprias dos tempos modernos...

Lembro que quando entrei como escriturário no DMAE, os engenheiros não batiam ponto, estavam liberados desta humilhação proletária. Este paraíso durou  até  o início da década de 90, quando na Era Petista iniciou-se a saga do Universo em Desencanto dos engenheiros que, até então, eram os todo-poderosos do Departamento. É, acreditem ou não, houve uma época em que por todo o território portoalegrense predominava a espécie dos engenheiros, hoje ameaçada de extinção por seus predadores naturais, com a ascensão dos procuradores e advogados na cadeia alimentar dos benefícios municipais. Naquele tempo, todos nós arigós, sub-espécies não técnico-científicos, queríamos ser engenheiros e usufruir das regalias desses semi-deuses. Os engenheiros dispunham de um carro locado com motorista para fazer o leva-e-trás de casa para o Dmae, e vice-versa, tanto na pegada de manhã como ao meio dia e na saída do expediente. Era uma vida  de  senador, eu imaginava, como um método neuro-linguístico de me motivar a terminar o meu curso de engenheiro, enquanto pegava quatro ônibus  por dia e nem tinha carro. É de se imaginar também, pelo que se conhece do bicho homem, que alguns abusavam e estendiam estes benefícios para levar e trazer a mulher do supermercado e do cabelereiro, as filhas do colégio e até convocavam estes carros locados para passearem alguns finais de semana com a família...Afinal, Brasília é o reflexo do Brasil!
Depois os tempos mudaram, a poderosa Associação dos Engenheiros do Dmae (AED) teve que ceder o seu lugar para as demais classes de técnicos científicos, mediante o surgimento da ASTED no Dmae. Por sua vez, também a ASTED se  extinguiu  ao se diluir no grande buraco negro de todos os técnicos científicos da prefeitura, numa tentativa desesperada de unificação na ASTEC, na  luta de todos contra  a ideologia bem sucedida dos Procuradores e Advogados de que “cada cargo deve lutar por si” em busca de suas próprias vantagens.
Sei que quando eu finalmente consegui me formar e assumir o cargo via concurso público, em 1992, já não havia mais nada daquele antigo glamour no cargo de engenheiro do Dmae. Havíamos caído na arena comum dos mortais: cada um correndo no seu próprio carro para bater o “santíssimo ponto” quatro vezes por dia,  no horário e sem atrasos para não ter que beijar a mão da chefia em troca de um mísero abono no cartão...Decaímos até o limite do orgulho profissional da nossa função social, o qual tem nos levado a reagir e sair na luta dos Capacetes Brancos pelo recebimento de uma “Verba de Responsabilidade Técnica” (mas isso já é tema para uma outra matéria no blog, aguarde!).
Enquanto tudo isso acontecia  no Planeta Dmae, em termos de mega evolução tecnológica  na gestão dos horários de efetivo trabalho dos seus servidores,  a maioria dos demais planetas  do Sistema Solar da Prefeitura Portoalegrense permaneceu na romântica e humanística gestão do início da era industrial, que consiste na livre assinatura pura e simples no lendário Livro Ponto...

ATEUS, GRAÇAS A DEUS & ENXAQUECAS ESPIRITUAIS

O  MOVIMENTO DOS SEM FÉ (MSF) 

           A polêmica que colocou a ATEA (Associação dos Ateus e Agnósticos) em evidência nos jornais e na internet foi motivada pela controvérsia do veto ocorrido (em São Paulo, Salvador e Porto Alegre) de uma campanha concebida pela entidade para combater o preconceito contra os ateus.
          Quatro peças publicitárias em defesa do ateísmo, que seriam veiculadas nos ônibus de Porto Alegre, foram vetadas pela Associação dos Transportadores de Passageiros (ATP). Todas elas expressam algum aspecto do pensamento ateu e exigem o fim do preconceito contra quem não é religioso. A ATP barrou as peças, justificando que a legislação municipal proíbe manifestações religiosas (na verdade, são vetadas peças que estimulem a discriminação religiosa).
           O caso Datena (jornalista da TV Band) foi exemplar. Ele apresentou um bandidaço que violentou e matou uma criança e disse: “Esse tipo é um ateu, um homem que não tem Deus no seu coração, porque quem não tem Deus é que faz uma coisa dessas”. Não havia nenhuma informação sobre se o criminoso era ateu ou não. O Datena estava atacando o ateísmo, o que está sendo objeto de um processo judicial movido pela ATEA.
          Segundo o IBGE, as pessoas que se declaram sem religião já chegam a quase 8% no Brasil, e constituem uma minoria cercada de preconceitos, pois o ateu é apenas alguém que não acredita em mitos. Neste sentido a ATEA preparou os anúncios, financiados pelas contribuições dos sócios, sob a inspiração de campanhas similares realizadas em diversas partes do mundo desde 2008, quando apareceram na Inglaterra ônibus com a lateral ornada pelo slogan “Deus provavelmente não existe. Agora pare de se preocupar e aproveite sua vida”.
                 Vamos, pois, conhecer os argumentos da ATEA: Não aceitamos mais que o ateu seja associado a algum mal moral. Nossa prioridade são especialmente campanhas públicas que permitam a percepção dessa condição, de que há uma vida ética, uma vida filosófica, uma validade cultural do ateu. No Brasil, debates sobre temas como aborto e pesquisas com células-tronco têm sido continuamente afetados por crenças religiosas (como as hipocrisias sobre o aborto que se viu na última campanha eleitoral para presidência, por parte dos dois candidatos concorrentes no segundo turno!). Neste caso, o ateísmo sai em defesa da democracia: manter a religião saudavelmente separada das questões do Estado e da Justiça.
             Nem ateus nem crentes podem reivindicar o monopólio do caráter, da vida interior, da tolerância e mesmo da inteligência.
                                                                          Nietzsche, Freud, MarxHitchens, Sam Harris, Dawkins
        Conforme vamos envelhecendo, na medida em que nos aproximamos do umbral que reúne os sexagenários, por mais que se evite, a questão da morte vai se infiltrando na pauta das nossas preocupações e pensamentos rotineiros.
        A questão central, desde que o homem é um animal racional, se resume na dúvida se a morte é ou não o fim de tudo. Se do pó viemos e ao pó voltaremos, ou há algo em nós que sobrevive em outra dimensão. Chega-se, pois, à questão crucial que se dá no âmbito da crença, já que a racionalidade científica ainda não conseguiu decifrar este mistério.
                 Saramago, era ateu juramentado.
           Enquanto um cinquentão agnóstico, que já transita na segunda metade do decanato, vou antecipando alguns estudos sobre as possíveis crenças que reúnem potencial para me conquistarem como mais um adepto. Para  um agnóstico, com fortes propensões materialistas, há uma imensa distância e enorme dificuldade para fazer a travessia do mundo concreto dos ateus para o universo abstrato dos crentes.

        Recentemente encontrei a primeira brecha entre estas duas concepções do sentido da existência humana, que é a peculiar percepção budista de que a mente é, ao mesmo tempo, o veículo e o próprio túnel que liga a materialidade corporal, captada pelos sentidos, com a existência além da morte física. A crença, neste caso, é de que haja renascimentos cármicos e evolucionistas. Por mais paradoxal que pareça, o budismo é uma doutrina de ateus, onde os crentes não acreditam na existência de um Deus criador e juiz supremo da vida.
           Mais recentemente ainda, como as enxaquecas crônicas da minha mulher não passam com nada (ela já está feito o Michael Jackson, viciada em analgésicos), passamos a freqüentar um centro espírita, em busca de alívio para as “nossas dores de cabeça” desta vida.
          Pois o espiritismo se revelou ser também uma brecha que faz a coligação entre os dois mundos, o dos encarnados e o dos desencarnados, dentro de uma perspectiva da crença cristã, mas com uma abordagem do Evangelho segundo o espiritismo do Allan Kardec. A crença neste caso também é que haja renascimentos cármicos e evolucionistas, mas aqui é o espírito que é imortal.

           Embora, enquanto cristãos, os crentes espíritas acreditem num Deus todo poderoso e maestro do universo, suas crenças se articulam mais com o filho deste Deus que se fez humano, decifrando suas parábolas com leituras mais contemporâneas e menos enigmáticas: “Dos pobres de espírito será o reino dos céus”, significa que será dos crentes e não dos intelectuais; “ofereça a outra face”, significa evitar o revide e oferecer a paz; etc.
          O grande trunfo dos espíritas, em relação a todas as outras doutrinas, é disporem de um contato imediato direto dos médiuns com os espíritos que se encontram no além da vida. Esta vantagem, em termos de consolação para a dor daqueles que perderam entes queridos, é insuperável e consiste no grande atrativo para captar novos crentes entre os lobos que chegam, feito eu, nas estepes sem horizontes da terceiridade...
     Ultimamente nós, os brasileiros, surfamos forte na grande onda cinematográfica sobre o tema do espiritismo no cinema nacional. Assistimos no final de 2008 ao filme “Bezerra de Menezes: O Diário de Um Espírito”, que acompanha a vida do médico Bezerra de Menezes (interpretado por Carlos Vereza), conhecido como o médico dos pobres. A narrativa tem início na infância do personagem, no sertão nordestino. No Rio de Janeiro estuda Medicina, elegeu-se vereador e deputado em várias legislaturas e defendeu as idéias abolicionistas. Mas o que lhe trouxe o maior reconhecimento foi o trabalho anônimo realizado em prol dos desfavorecidos.
      O filme acompanha a trajetória de Bezerra (29 de agosto de 1831 - 11 de abril de 1900) narrando o seu contato gradativo com a religião espírita. O roteiro busca focar como um documentário as dificuldades da época em relação a uma nova religião (espiritismo era tido como algo sobrenatural, ou até mesmo, demoníaco) com suas sessões mediúnicas, psicografias e a existência de seres que nos rodeiam com o intuito de auxiliar no caminho.
            No começo de 2010 assistimos ao filme “Chico Xavier”, uma adaptação para o cinema que foi dirigida por Daniel Filho, e que descreve a trajetória do médium (interpretado pelos atores Ângelo Antônio e Nelson Xavier), que viveu 92 anos (de 2 de abril de 1910 até 30 de junho de 2002) nesta vida terrena desenvolvendo importante atividade mediúnica e filantrópica. Fechava os olhos e colocava no papel poemas, crônicas e mensagens. Seus mais de 400 livros psicografados, consolaram e continuam consolando os vivos, pregam a paz e estimulam a caridade. Para os admiradores mais fervorosos, foi um santo. Para os descrentes, no mínimo, um personagem intrigante.
         A cena que abre o filme é a preparação de Chico Xavier para uma entrevista (que foi real e que ficou famosa) num programa de TV. A entrevista serve de base para o roteiro, servindo de gancho para os flashbacks, em ordem cronológica, que contam a vida do médium.
        Nelson Xavier, o Chico mais velho, é o ator perfeito para o papel. Parece que estamos vendo o próprio Chico Xavier na tela o tempo todo, até que ao final são repassadas as cenas reais da entrevista dele na TV, e podemos verificar a autenticidade das suas respostas, sempre bem humoradas, com as cenas que já haviam sido interpretadas no filme.
         No final de 2010 foi a vez do filme Nosso Lar, baseado no clássico da literatura espírita brasileira, que é o romance Nosso Lar, que versa sobre os primeiros anos do médico André Luiz após sua morte, numa "colônia espiritual", espécie de cidade onde se reúnem espíritos para aprender e trabalhar entre uma encarnação e outra. O filme, que já foi assistido por mais de 4 milhões de brasileiros, relata esta experiência pós-morte contada por intermédio de psicografia para o médium Chico Xavier, que a transformou em um best-seller de mais de dois milhões de livros vendidos.
       O romance levanta questões acerca da Lei de Causa e Efeito (cármicos) a que todos os espíritos, segundo o espiritismo, estariam submetidos.
        Confesso que me encontro muito impressionado com a surpreendente semelhança que há entre o budismo (doutrina que venho estudando nos últimos anos e praticando intensamente o seu fundamento básico, que é a meditação) e a doutrina espírita, a qual tenho vivenciado nos últimos meses na Sociedade Beneficente Espírita Bezerra de Menezes. É formidável a capacidade organizacional dos trabalhadores voluntários desta casa espírita, os quais oferecerem diariamente consolo, conforto e orientação espiritual para centenas de pessoas. Tive a oportunidade de, com a desculpa de ser acompanhante, abrir a minha “mente conscienciológica” e me submeter interagindo em todo o ciclo de atividades prescritas pelo centro espírita: consultas, tratamentos, passes magnéticos (individuais e coletivos) e palestras doutrinárias e de valorização à vida; todas as atividades de altíssimo nível espiritual, intelectual e filosófico.

           Rumo aos sessenta anos de idade, a busca da “saída de emergência” continua!....(Até porque as enxaquecas físicas e espirituais também continuam).

DEMISSÕES A BEM DO SERVIÇO PÚBLICO

          Essas chuvaradas de verão pelo pais todo, enchentes, deslizamentos e mortes...Estas inundações no entorno do DMAE, nas ruas Gastão Rhodes e Princesa Isabel, fazem a gente ficar com cara de “abobados da enchente” olhando a chuva pela janela e relembrando causos...
          As más línguas sempre comentam que a carreira de funcionário público é absolutamente estável, que ninguém vai pra rua, que ninguém é demitido por mais vagabundo e por mais besteiras que faça. Por vagabundagem, depois do estágio probatório, realmente nunca vi acontecer nenhuma demissão. Geralmente os acasos mais problemáticos são os de alcoolistas, que são classificados como doentes portadores de dependência química e ficam batendo o ponto e dormindo pelos vestiários. Mas quanto às besteiras, não é bem assim. Conheço pelo menos dois casos de “demissão a bem do serviço público”.

          Num desses casos, pelo que se soube de boca em boca, o Geraldão (o cara que fez a cirurgia colocando anéis para reduzir o estômago, mas que parece que comeu até os anéis, pois continuou bem gordinho), que trabalhava na seção administrativa da DVA, naquele verão estava exercendo a chefia da Seção em substituição à Neusa, que estava em férias. Ocorreu que o Normando procurou a chefia substituta para que ele registrasse na folha ponto daquele mês determinado número de horas extras, “como de praxe”. Inocentemente e tentando se preservar de escorregar em possíveis “cascas de bananas” durante seu breve exercício da chefia, o Geraldão submeteu o pedido do Normando à aprovação prévia da diretora da Divisão. Surgia aí o estopim da maior bomba de “escândalo administrativo” que tive conhecimento em toda a minha carreira de servidor público, a qual ao ser detonada deixou pelo menos três vítimas com gravíssimas seqüelas para o resto de suas vidas.
           A direção da DVA, que desconhecia a “prática de praxe”, ao investigar o assunto descobriu que havia um esquema de corrupção instalado no seu setor administrativo. Aperta daqui, pergunta dali e revelou-se como mentor do esquema o Alemão Valter (que já fora chefe do administrativo por muito tempo) e como operadora a Neusa. Ambos eram pessoas muito bem conceituadas por todos: o Valter era um sujeito empreendedor (numa época sei que teve uma loja de floricultura e picareteava com vendas de carros usados) e a Neusa era uma pessoa seríssima e dedicada ao trabalho. O Normando, que era um auxiliar administrativo, o peão da jogada,  entrou de carona nesta mamata para fazer o serviço sujo, na qual mamaram os três por muito tempo...até que a teta explodiu como uma bomba!

          O esquema de corrupção consistia em acrescentar cerca de cem horas extras para cada um na Folha Ponto, após ela ser assinada pela Direção (que nesta época era exercida pela Engª Susana), e antes da Folha ser enviada para a Seção de Pagamentos da DVH. Resultou da instalação de uma Comissão de Sindicância um relatório que determinou a abertura de um Inquérito Administrativo, e o inquérito sentenciou a demissão sumária dos três envolvidos “a bem do serviço público”.
       Deu pena de ver, pois eram todos funcionários da velha guarda, tanto que durante o processo o Valter aposentou-se e, quando todos pensavam que ele tinha se escapado do castigo, salvo pelo gongo, teve a sua aposentadoria revogada em decorrência da sentença de demissão. Ficaram todos desempregados....

        O único outro caso semelhante que tive conhecimento foi o ocorrido com o Engº  Bins. Consta que um funcionário desafeto dele teria documentado com fatos & fotos e denunciado o desvio de caliças (e outras “coisitas”) de obras do DMAE que o Bins fazia para uma obra de sua propriedade. Não soube de maiores detalhes, mas no final do processo o ex-colega, já careca de tanto tempo de trabalho, também foi demitido “a bem do serviço público”. Mas, segundo comentários recentes, parece que o Bins fez um novo concurso público e estaria prestes a ser readmitido como engenheiro na Prefeitura de Porto Alegre...Será?...Será que o cara deu uma de político e se demitiu antes de ser cassado?...Tudo é possível nesta vida!
...Mas as águas estão subindo muito rápido na rua, preciso interromper esta contação de causos nostálgicos para ir correndo mover o meu carro e evitar a inundação que já está batendo na porta!...