AS GARÇAS DO DMAE



Somos como as garças
Que voam para o Dmae
Para buscarem o alimento
Nas águas de seus decantadores
E depois migram com o vento...

Mas sem suas asas, meros trabalhadores
Decantamos em seu colo Dmãe
Como seus fiéis filhos servidores
Até migrarmos envelhecidos pelo tempo
Levados na viagem sem volta do vento.

O FOTÓGRAFO DA MANUTENÇÃO


        A coleção de fotos das garças no Dmae, como outras coleções que vão ser apresentadas neste blog do Diário de um Aposentado, surgiram gradativamente a partir de 1999, na medida que, por inclinação pessoal, passei a assumir a função de tirar fotografias no Dmae. Inicialmente esta tarefa de fotos era para fazer ilustrações dos manuais de procedimentos de manutenção para os novos tipos de equipamentos que estavam sendo instalados nas estações do Departamento, especialmente nas ETAS (Estações de Tratamento de Água) e na ETE São João Navegantes (Estação de Tratamento de Esgoto). Diante da necessidade demandada a Divisão de Manutenção adquiriu uma máquina fotográfica digital de 1 Megapíxels (daquelas que a memória era um disquete), com a qual passei a fazer também uma cobertura fotográfica externa e interna das estações do DMAE para serem incorporadas ao cadastro das Estações no Sistema SIGES e às suas respectivas “pastinhas físicas”.
Na seqüência, após o roubo da primeira máquina, foi adquirida a atual máquina Sony  de 4.1 Mp (que filma com áudio) e, em função de já ser considerado quase que oficialmente o “fotógrafo da DVM”, acabei assumindo também a nova tarefa criada para elaboração de laudos de baixas patrimoniais de equipamentos, pois nos laudos há a necessidade de se colocar as fotos dos referidos equipamentos para que os membros do “Conselho Deliberativo do DMAE” visualizem sobre o que estão deliberando.
O lance de sacar uma boa foto e de perceber quando ela se oferece no cotidiano é um momento de inspiração que “dá barato”, por ser um ato criativo e artístico. Pensando bem, e esta é a fase da vida de se fazer estas reflexões de auto-conhecimento, depois de escrever poesia e crônicas literárias, a fotografia tem sido a minha atividade mais constante em ocasiões de lazer.
Em verdade, desde sempre eu gostei de fotografias, mas como bem antigamente esta era uma atividade dispendiosa e a grana era curta, o luxo de bater fotos ficava somente para os eventos comemorativos e de significado especial. Pra se ter uma idéia, na minha casa tenho, por enquanto, 50 álbuns de 100 ou mais  fotos cada, o que seguramente soma mais de cinco mil fotos captadas nas últimas duas décadas, o que resulta uma média de 250 fotos impressas por ano. Isso tudo sem contar as fotos digitais não impressas, que apenas ficam rolando no protetor de tela do meu computador. Confesso que resisti muito para aderir particularmente à foto digital por isso: por verificar que as pessoas, ao não precisarem mais revelar e imprimir as fotos para vê-las, estão praticamente extinguindo as fotografias em papel de suas vidas. O fato é que, com a dificuldade de organizarmos de modo definitivo os arquivos digitais, acabamos perdendo o controle sobre a localização das fotos no decorrer dos anos, ainda mais se houver algumas formatações e trocas de computadores neste período, o que é praticamente inevitável. Hoje em dia, totalmente convertido à modernidade digital a partir de 2008, avalio que mando imprimir cerca de 20% ou menos das fotos que registro, ou seja, exerço o processo de seleção natural das melhores, mas não deixei de imprimir. Sou da moda antiga: local de boa foto é no papel!
            Assim, sendo por gosto próprio uma das minhas atividades funcionais fazer coberturas fotográficas,  passei a ser solicitado como fotógrafo em todas as atividades e eventos da manutenção, inclusive os comemorativos de  aniversários, churrascos e festas de final de ano. Deste exercício semi-profissionalizado  de bater fotografias pelo prazer e gosto estético resultaram centenas de “retratos” reunidos em várias possíveis  Coleções Temáticas de Fotos: As Garças no Dmae, Caras do Dmae, Estações do Dmae, Homens em Obra, Vistas da DVM, Confraternizações...

Uma Categoria em Extinção

(segunda-feira – 30/11/09)
        Para completar o quadro da minha sala de trabalho, registro que somos três engenheiros homens e mais a engenheira Catarina Maria Reina Cánovas, numa sala de 21 m2. Somadas, nossas idades totalizam 235anos, mais de dois séculos, o que perfaz uma média de 59 anos por cada barnabé! A Catarina é um caso à parte, pois de há muito já completou seu tempo de serviço (há mais de dez anos), mas não quer se aposentar. Quando todos nós, colegas de sala, éramos ainda estudantes de engenharia, ela já exercia o ofício de engenheira elétrica com pioneirismo na empresa. Ainda hoje ela é, com sua entrega e dedicação ao serviço, uma referência, um estímulo e também uma cobrança permanente para que mantenhamos alto desempenho, sem nunca nos deixar cair num ritmo de trabalho característico de “aposentandos” em final de carreira. Definitivamente a Catarina, feito uma workaholic, só irá se aposentar pela compulsória, isto é, aos 70 anos de idade, o que só deverá acontecer daqui a quatro anos...quando então a sala será extinta com os seus dinossauros.
        A carreira do funcionalismo público municipal é ridícula, consiste em “avanços” de qüinqüênios, que acresce 3%, e nas chamadas mudanças de letras de A até D, processo que se tornou um funil por onde poucos passam de uma letra pra outra, para se obter um acréscimo de 5% no básico do salário. Como todos os membros da sala já atingiram o topo da carreira, a letra D, somos tidos como os Dinossauros.
        Estamos sentindo realmente a sensação de sermos uma espécie que está sendo caçada deliberadamente tendo em vista a sua extinção, com forte pressão internacional inicialmente para privatização do setor público, na era FHC, e atualmente, na era Lula, através da terceirização ou das chamadas participações público-privadas (PPPs).
        Faz muito tempo que já não se realizam concursos públicos, e dado o envelhecimento do quadro funcional, que já faz fila e se aglomera na passagem pela roleta da porta de saída para a aposentadoria, a tendência é que cada área de atividade do funcionalismo público vá entrando em extinção e sendo terceirizada, na medida que vá vagando seus cargos. Tudo gradativamente, sem alardes, uma extinção de uma categoria de forma indolor, como em câmeras de gás, e difundida em comícios da esquerda e da direita como uma cura homeopática das mazelas da nação.

Sentença Cumprida

(quarta-feira – 26/11/09)


        O outro meu companheiro de cela, o Jalba Dias da Rosa, acabou de cumprir este mês a sua sentença, no caso dele somou os 95 com 58 de idade e 37 anos de serviço. Ele inclusive já experimentou antecipadamente dois meses consecutivos de regime semi-aberto em casa, usufruindo de licenças-prêmio, período em que ficou cuidando dos cachorros e servindo de motorista para a família. Agora apenas aguarda a virada do ano para gozar o derradeiro período de férias, com direito a recebimento do 1/3 em pecúnia, para poder entrar em estado de gozo permanente, para não mais retornar ao regime de confinamento por oito horas diárias.

O cabalístico número 95

(quinta-feira – 25/11/09)

       Hoje um dos meus colegas de cela, o Álvaro Silveira Neto, está fazendo aniversário, comemorando 56 anos de idade. Mais do que a pirâmide etária brasileira que já acusa uma acelerada tendência ao envelhecimento, o quadro funcional do órgão público em que trabalho está ficando predominantemente grisalho e cinquentenário. O assunto de cada festinha de aniversário, portanto, gira em torno das perspectivas relativas aos critérios de aposentadoria. A pergunta usual agora é a seguinte: Quanto soma a nova idade e o tempo de serviço do aniversariante? Atualmente, após as sucessivas “Reformas da Previdência”, implantadas inicialmente pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, que passou a exigir a idade mínima de 53 anos, seguida pela do Presidente Lula, emendada com a PEC do Senador Paim, que estabeleceu a idade mínima para aposentadoria em 60 anos, criou-se um processo de transição que exige que a soma da idade e do tempo de serviço seja igual a um número cabalístico: 95 para os homens e 85 para as mulheres. Atualmente somo 93, portanto no ano que vem, com mais um ano de idade e completando mais um ano de tempo de serviço, fecho os 95 e posso sair pra nova etapa da vida sem prejuízo dos meus vencimentos.

Banco de Praça

(terça-feira -24/11/09)

        Em tempos de globalização e de busca de qualificação dos serviços públicos, um projeto de reestruturação da empresa está agitando o quadro funcional. Hoje fui convocado para participar de uma reunião sobre a definição do uso dos espaços físicos para se adaptar ao funcionamento da nova estrutura operacional a ser implantada, se possível, ainda este ano, pois o próximo é ano eleitoral e a coisa se complica para a sua aprovação na Câmara de Vereadores.
       Levei para a reunião uma caneta e uma folha em branco, onde fiquei desenhando abstrações, sei lá porque, sob uma temática musical: desenhei uma grande cortina aberta, como a boca de um palco, onde se via um piano de calda, um saxofone, um contrabaixo, uma coluna de caixas de som e uma bateria completa em cujo bumbo, no lugar do nome da banda, estava escrito “The Last Year”.
      Ao final da reunião, onde várias reformas e novas obras foram relacionadas como demandas necessárias para a tal reestruturação, apenas reafirmei a minha única reivindicação, que já é antiga e não contemplada em reformas físicas anteriores do meu local de trabalho. Solicitei que seja colocado um banco de praça no pequeno recanto gramado e arborizado que conseguimos desenvolver no pátio interno, rodeado de concreto, das dependência da Divisão de Manutenção, nem que seja para eu usufruir depois de aposentado, quando vier visitar os ex-colegas.


      

Presente de Grego

(segunda-feira-23/11/09)


         Como ainda resta um final de semana de plantão a ser feito por mim na escala até o final de 2009, às vésperas do natal, eu que nunca quis fazer plantões no verão nem em datas festivas e feriadões, resolvi doá-lo para outro colega engenheiro, sem troca, como se fosse um presente de grego de final de ano.
       Definitivamente, para mim chega de plantões, daqui pra frente só me interessa a potencial poupança do sobreaviso a ser buscada na justiça. Mas, justiça seja feita, além da grana, estes serões solitários de sábado e domingo na minha sala de trabalho foram muito úteis por me propiciar estudar filosofia para as provas e trabalhos da faculdade.

50º Aniversário do amigo Konrad

(quarta-feira-18/nov/2009)


          Dia do 50º aniversário do Konrad, colega e amigo, companheiro de caminhada pela última década. Amizade que sobreviveu às divergências advindas após a “ascensão e queda” petista na capital e no Estado gaúcho e, sobretudo, às desavenças acerca do monopólio do Lulismo no governo nacional e na política internacional. Encontramos caminhos peculiares de convergências no âmbito cultural: na música, cinema e trocas de escritos pessoais. Tanto que aproveitei a visita que fiz em sua sala de trabalho hoje para abraçá-lo pela data e para devolver-lhe os DVDs que ele tinha me emprestado: Grande Sertão Veredas (1965 – de Geraldo Pereira dos Santos com Maurício do Valle), Moby Dick ( 1956 – de John Huston, com Gregory Peck), Lolita ( 1962 – de Stanley Kubrick), Acossado ( 1959 – de Godar, com Jean-Paul Belmondo), Cortina Rasgada (1966 – de Alfred Hitchcock, com Paul Newman e Julie Andrews) e Muito Além do Jardim (1979 – de Hal Ashby, com Peter Sellers e Shirley MacLaine). Em contrapartida dei-lhe de presente um CD-Duplo com a discografia completa do Zeca Baleiro pirateada em mp3.
        Os próprios títulos e datas dos clássicos cinematográficos já dão o tom do tipo de complemento cultural “retrospectivo” que ocorre, o que também acontece no campo musical, acrescido do intercâmbio poético e literário de observação da vida e da conjuntura política da atualidade; reúne ingredientes que permitem a projeção de uma perspectiva longeva para a nossa relação de amizade, para muito além do jardim dos muros do local de trabalho e capaz de se espraiar nas praias da aposentadoria. Um sinalizador neste sentido é que vou no sábado na casa dele comer uma pizza caseira, feita pela esposa e pizzaiola Maria, para comemorarmos juntos este rito de passagem dele para a segunda metade menor da vida (salvo raras exceções, faço votos que seja uma característica própria dos arquitetos, como o outro arquiteto Oscar Niemayer que já passou dos cem). Registre-se, para fins do dimensionamento simbólico, que este colega é o único que eu frequento a casa, ao longo de toda a minha carreira na empresa. Definitivamente não sou uma pessoa social, pelo contrário.

Bolsas de Estudos

(terça-feira /17/nov/2009)


         Dia de cadastramento para o benefício de Bolsa de Estudos para os funcionários e seus dependentes. Faz parte do “Plano B” para a minha filha, caso não passe no vestibular para Sociologia na UFRGS, fazer também o vestibular da PUCRS para o curso de História e se manter ocupada em atividades universitárias, a um custo reduzido em 50% pelo benefício das bolsas fornecidas pela empresa. Todavia, esta carta na manga está destinada a se extinguir ao final de 2010, pois os aposentados perdem o direito ao benefício e eu não estou disposto a adiar minha alforria vendendo mais um pedaço de minha vida, por mais nobre que possa parecer a causa.

Consulta Jurídica

    No dia seguinte enviei um e-mail para a minha advogada: Ana, fiz um levantamento de quantos plantões eu havia feito nos últimos dois anos, pois estes constituem uma espécie de “poupança em potencial”. O sonho de liberdade deste aposentando (saio no final de 2010!) é comemorar a sua alforria se auto-presenteando com uma viagem à Europa, ao Velho Mundo, pelo menos contemplando Espanha, Itália e Portugal. O plano de fuga para uns quinze dias na Europa é o seguinte: como a empresa não paga as horas em que os plantonistas ficam de “sobreaviso”, à disposição com o celular da própria empresa para eventuais chamados de urgência, todos os plantonistas pensam que este período de horas-extras poderá ser requerido na justiça como um direito trabalhista.
    A memória de cálculo estimado é de que cada plantão (das 17:30 horas da sexta-feira até as 8 horas da manhã de segunda feira) totaliza 62 horas, e como a empresa paga apenas 8 horas (que corresponde a dois meios turnos cumpridos efetivamente com o cartão-ponto batido), resta de sobre-aviso 54h por cada plantão. Como eu fiz 16 plantões nestes dois últimos anos (e que ainda não preescreveram legalmente), resultam 864 horas (16 x 54hs) que, supondo que a justiça exija o pagamento de 25% destas horas (usual no regime celetista) como em “regime de sobreaviso” (864 x 0,25), são 216 horas que deverão ser pagas; a um custo de cerca de R$ 43,00/hora, resulta uma indenização devida (216 x 43) de R$ 9.288,00 = 5.160 dólares!!!
    Mesmo descontando os custos advocatícios e tirando a parte do leão do imposto de renda, deve dar pra custear o básico desta viagem dos sonhos.
    Ana, estude com carinho as viabilidades jurídicas desta minha pretensão de petição. Fico na expectativa. Abraço.

Um Sonho de Liberdade

    Domingo, dia 15 de novembro de 2009, ao abrir meu correio eletrônico no computador da empresa onde trabalho encontrei um e-mail do meu amigo aposentado: E daí Xirú? Essa moleza vai acabar no ano que vem. Vai dar saudade dos plantões de domingo.
    Minha resposta, também por e-mail, foi imediata e determinada, como exigia a ocasião por ser o dia da proclamação da república: Este será o meu último plantão! A partir de agora vou ir cortando os vínculos e jogando ao mar, durante a travessia de 2010, para romper com as dependências financeiras na hora de sair para o “MEU SONHO DE LIBERDADE”. Diferente do filme Um sonho de Liberdade, em que após cinquenta anos de reclusão os presidiários (com Morgan Freeman) têm medo de sair deste mundo que eles já dominam e são respeitados; mas semelhante ao protagonista do filme, estou conseguindo cumprir minha pena cavando pacienciosamente, sem enlouquecer, um túnel para a liberdade integral do meu tempo e mantendo acesa a esperança de que o melhor da vida ainda está por vir.
    Depois de cumprir 38 anos de sentença de trabalhos forçados em regime semi-aberto, vou me aposentar e quero sentir todo o tédio do ócio fumado e prensado direto no cérebro, vou adorar a saudade do presídio! Espere por mim...abraço meu irmão!

Barnabetismo Dmaeano


















A minha obra sempre foi
fazer a água no cano rolar
isto eu sei de sobra
o que eu não sei é cobrar:
cobrar do usuário-cidadão
respeito pelo meu trabalho
cobrar do prefeito, meu patrão
meus direitos de proletário.

No dia-a-dia de todos os dias
na torcida do "chega cinco e meia!"
a vida escoa nesta monotonia
de bater cartão...
de dar explicação para a chefia
Mas com a compensação de ver o saneamento
chegar às vilas humildes da periferia

Nas fugas drenadas do meu salário
de servidor público municipal
tem AFM, Previmpa e ASDMAE
a mordida do Leão e muito mais
e sempre as perdas salariais!

E no fim do mês
do ano e da vida
sempre é racionada a grana
que em marcha é consumida

Na decantação do tempo
se renovam gerações
no fluxo da captação ao expurgo
através do ralo da aposentadoria
quando, sem o devido tratamento
sofremos o corte de regulares ligações
com colegas, amigos, flertes e amantes

Sem um reservatório de sobras
seremos como flóculos flutuantes
ou como a gota que entrou pelo cano
que talvez por engano cadastral
possa ter entrado em cano cloacal...

Acreditando que, no fim, tudo flui ao mar
e que o mar não vai salgar as nuvens com o seu sal
a água benta do Guaíba vai se preservar
como matéria prima da vida hidrometrada 100% na capital.