FINAL DO CAMPEONATO BRASILEIRO DE VOTOBOL

          Este pleito eleitoral de 2014 está sendo um campeonato com fortes emoções, ao contrário do Brasileiro de Futebol que desde o início do primeiro turno tem o mesmo time na liderança, mas também já teve na segunda posição vários perseguidores do líder se alternando entre si como o “menos pior” da rodada. Percebe-se que Minas Gerais está em alta no cenário nacional, não só com a equipe do Cruzeiro, mas também com a do Real que o Aécio Neves se apropriou, e com o time do Bolsa da família da Dilma Rousseff, ambos questionando reciprocamente o DNA de paternidade da cria do oponente.
             O clube Cruzeiro venceu o Campeonato Brasileiro passado e, assim como a Dilma do clube do PT, busca ser bicampeão agora. Ambos dispararam na frente e garantiram longa vantagem sobre os outros concorrentes. Diferente do Cruzeiro que segue tranquilo na ponta de cima da tabela, a Dilma viu a sua vantagem ser ameaçada quando, de repente,  a Marina Silva passou de reserva a titular do PSB, com a morte do candidato Eduardo Campos na primeira quinzena de agosto. A polaridade entre esquerda e direita, entre PT e PSDB, que já estava sendo administrada com tranquilidade pelo plantel  governista (que até já considerava a possibilidade de vencer no primeiro turno), foi substituída por um embate com uma oposição inesperada de dentro do campo da esquerda que ergueu a faixa em defesa da sustentabilidade ambiental no meio do jogo. Então, as pesquisas passaram a indicar um empate técnico entre as duas candidaturas, e a projetar a vitória da Marina Silva no segundo turno, com o tucano Aécio ficando fora da disputa.
          As estruturas tremeram, o que fazer? A temida tropa de choque petista iniciou então a guerra de guerrilha televisiva para a desconstrução da seringueira do Acre, com a candidata oficial tendo seis vezes mais tempo de TV do que a sua adversária aspirante à faixa de presidenta. Entre vacilações e jogadas baixas de um lado e outro, as rodadas de pesquisas do mês de setembro foram indicando a tendência de queda da Marina, até que nas vésperas do pleito em outubro o petismo conseguiu ressuscitar o abominável monstro das Neves, o Aécio, para disputar a vaga no segundo turno, por ser o adversário preferencial da Dilma, uma vez que o PSDB é freguês de caderno de perder para o PT. Foi assim que, numa virada emocionante, do ponto de vista das expectativas geradas, resultou das urnas como classificados para o confronto final os mineiros Aécio e Dilma (e o Cruzeiro?). Ele ungido pela histórica política do “café-com-leite”, com os votos de São Paulo; ela alicerçada na clientela cativa do Bolsa Família no norte-nordeste.
           O efeito do aquecimento eleitoral da Marina foi o de degelar blocos de eleitores dos dois polos, mais do polo da esquerda do que do da direita, para devolvê-los no segundo turno como torcedores na proporção inversa para cada polo, de modo a equilibrar a disputa num empate técnico no tempo regulamentar,  até que as cobranças das penalidades máximas pelo povo nas urnas no dia 26 de outubro defina o escore. A marola Marina foi novamente a sensação desta temporada eleitoral e pode ter sido decisiva para o resultado final do Campeonato Brasileiro de Votobol deste ano, ao contrário do anterior em que ela se omitiu de exercer o seu protagonismo no segundo turno. 
          Apesar de tudo, das besteiras e acertos que o governo petista fez, e sobretudo pelo que deixou de fazer para mudar o modo de se fazer política neste país, meu auto patrulhamento ideológico não me permite (ainda?) votar na direita. Ainda não consigo fazer isso, nem como sendo um mero cartão vermelho para que a esquerda vá para o chuveiro mais cedo, esfrie a cabeça e repense suas jogadas ensaiadas doutrinariamente.  Mas já consigo me colocar no lugar do outro, no caso, no lugar da Marina Silva. Se eu sofresse a patrolada impiedosa que os ex-companheiros praticaram sobre a protagonista da bandeira universal da sustentabilidade, luta que deveria constar na pauta de qualquer partido que se pretenda de esquerda, eu também iria querer manter este mesmo protagonismo no segundo turno. Respaldado nos mais de 20 milhões de votos recebidos, eu também jogaria todas as minhas fichas em promover a “alternância no poder” como uma forma de desarticular a corrupção daqueles que se mantêm no comando e aparelhando por muito tempo a máquina pública.
É compreensível esta postura da Marina, até por que a grande agenda política da nova gestão no Palácio do Planalto, além do feijão com arroz de manter as conquistas sociais do Bolsa Família e de promover o crescimento econômico, será a de fazer a famigerada Reforma Política.  Reforma que agora ficou mais encruada ainda pela composição do Congresso que emergiu mais conservador das urnas neste pleito.  Eu boto fé é no pé da moçada que promoveu o Movimento dos “Vinte Centavos” de junho de 2013, o maior movimento popular de povo na rua da história política deste país, pedindo mudanças, ainda que de forma caótica, por não se sentir representado por este caótico sistema político-partidário. Senão vejamos, no primeiro turno 39 milhões de brasileiros não assinaram a súmula para entrar em campo na cabine de votação. Apesar do voto ainda ser obrigatório, a alienação eleitoral mostra que no mínimo 27% da população não se sente representada nesta panaceia de democracia não participativa.
A propósito, faltou neste certame eleitoral a seguinte discussão: Qual é a reforma política que queremos realizar? De minha parte lanço aqui meia dúzia mais um pitaco: 1– Acabar com o financiamento das campanhas políticas feitas por empresas (pessoas jurídicas), que é a fonte nascente da corrupção. 2– Acabar com as coligações em prol candidatos majoritários no primeiro turno, que é a fonte da vertente que torna moeda de troca os tempos nos horários eleitorais, tornando os partidos pequenos legendas de aluguel dos grandes em coligações sem nenhuma unidade programática. 3– Acabar com o preenchimento das vagas nas eleições proporcionais pelo atual critério do “coeficiente eleitoral” por legenda, onde um candidato bem votado pode eleger vários nas suas costas com votações muito inferiores a outros concorrentes de outros partidos. 4- Acabar com a vaga de suplente de senador, brecha para que os grandes capitalistas patrocinem a campanha e se tornem senadores sem terem sido eleitos diretamente, numa jogada ensaiada do titular sair para exercer algum cargo no executivo. 5– Criação do voto distrital, onde cada deputado mantenha vínculos com a sua região eleitoral e possa ser cobrado nas ruas pelos eleitores de sua comunidade. 6- Resgatar o voto como um direito e não como uma obrigação, pelo fim do voto obrigatório, como uma forma de tornar o ato de votar uma atitude facultativa e menos sujeito ao cabresto. 7 – Que os votos nulos recuperem a honrosa condição de “Votos Válidos” na legislação, pois diferentes dos votos brancos, que significam “qualquer um serve”, os votos nulos protestam afirmando que #nenhumcandidatonosrepresenta! E você, caro (e)leitor, quais questões colocaria na sua reforma política?...
Será que o Cruzeiro e a Dilma Rousseff vão conquistar o bicampeonato, ou vai haver mais uma reviravolta na competição? No futebol, os perseguidores do líder (São Paulo, Inter, Grêmio, etc.) têm poucas chances, mas no votobol tudo pode acontecer, pois o Aécio está chegando empatado na reta da semana final desta campanha eleitoral. E se ganhar o Aécio, qual é o grande medo mesmo? O tucano vai ter que cumprir as duas agendas, a dele, de fazer do PIBinho um PIBão, e a do PT (tipo dando 13º e férias para os beneficiários do Bolsa Família), para poder chegar competitivo e tentar eleger o seu sucessor em 2018, sabendo que vai  enfrentar o bicho papão do Lula: o gigante vai voltar! Enquanto a Floresta Amazônica segue agonizando, passivo encerro esta catarse ficando com o consolo dos ditados populares que rolam de boca em boca nas arquibancadas pelos estádios padrões Fifa: Há males que vêm pro bem, e não há bem que nunca se acabe, nem que a vaca tussa! No fundo sabemos que outros campeonatos de futebol e de votobol virão, quem sabe com outros times e novos craques...


Marina e eu, os filhos da floresta

Sem querer me comparar à candidata presidencial Marina Silva, que só se alfabetizou aos 16 anos de idade, eu só consegui me desvencilhar do curso primário e ingressar no ginásio também aos dezesseis. Por consequência deste atraso, sem querer entrar no detalhe de suas causas pedagógicas, só fui concluir o curso científico (o atual ensino médio) aos 21 anos de idade e ingressar na universidade apenas quatro anos depois, e demorei 12 anos patinando para conseguir o canudo de engenheiro. Definitivamente não sou um bom exemplo de aplicação escolar para os meus filhos, a não ser o de ser persistente.
 A exemplo da Marina Silva, de origem pobre que saiu da floresta amazônica abrindo trilhas na mata e continuou sempre ampliando sua visão de mundo com o seu talento, guardada as proporções, eu saí das matas da FEBEM, no Morro Santa Teresa, e também procurei continuar sempre ampliando a minha capacidade de conquistar novos domínios culturais. Apenas que sempre fazendo meus versinhos, para não perder a poesia da vida jamais:
Hoje sou agnóstico e apartidário, mas confesso que me interesso pelas questões religiosas que envolvem a reencarnação neste planeta e acompanho o jogo político, vendo a política como um jogo de movimentação estratégica de peças por interesses. Quando pela primeira vez a senadora Marina silva, ex-ministra do meio ambiente do primeiro governo Lula, levou toda a sua história de luta amazônica (junto com o Chico Mendes) para o Partido Verde do Gabeira, eu tentei me iludir que estava se formando o tsuname da esperada Grande Onda Verde.
Como dizia a canção do Belchior: Nossos ídolos ainda são os mesmos, mas o novo sempre vem...Outras lideranças, como o presidente Mujica do Uruguai, estão surgindo para formar a Grande Onda Verde em defesa da sustentabilidade do planeta e contra a cultura de consumo desenfreado. Cada movimento político, em seu respectivo momento histórico, contribui para o avanço das sociedades. Na década de 1980 se construiu o partido dos trabalhadores, feito com caras novas que, contrariando todas as previsões, chegaram ao poder. Mas, ao se misturarem com as caras das velhas raposas políticas, ao final de três mandatos já não se distingue mais quem é quem.
 Por consequência do trágico acidente aéreo que matou Eduardo Campo, a substituição do incipiente candidato presidencial fez ressurgir Marina Silva que havia tido o registro do seu partido estranhamente negado pela justiça eleitoral, inviabilizando sua candidatura e a levando a ser vice do PSB. Ressurgiu de repente, por desígnio do destino, como uma pedra no caminho do continuísmo petista no governo. Estranhamente por que dezenas de milhares das assinaturas de apoio exigidas por lei foram impugnadas para justificarem a negação do registro do Partido Rede Sustentabilidade, talvez inclusive a minha. Ao mesmo tempo, o Paulinho da Força Sindical, como um auxiliar do governo, teve facilidade para fundar um tal de Partido da Solidariedade Nacional, imagina-se com quantas falcatruas nas assinaturas que foram amigavelmente toleradas pelo TSE. Enquanto isso, a reforma política pedida pelos movimentos de rua de junho de 2013 continua sendo apenas retórica nestes políticos e partidos que não nos representam e sim seus patrocinadores de campanha e corruptores.
Marina Silva ressurgiu das cinzas que a burocracia da chamada “Justiça Eleitoral” incinerou, como uma pedra no caminho, nem que seja só para propiciar um tropeço na soberba dos petistas que, mesmo com suas maiores lideranças presas por corrupção e desvio do dinheiro público, sequer admitem nem fazem autocrítica. Marina ressurgiu para provocar uma alternância no poder, pelo menos por um mandato, para fortalecer esta alternativa política e propiciar que o país supere de vez o cenário enfadonho da polarização entre apenas dois partidos, ampliando assim o leque de opções de escolhas para a população. Em apenas um mandato de alternância no poder já dá para desmantelar as conexões de corrupção estabelecidas como permanentes, conexões que ocorrem sempre em todos os governos que se prolongam por muito tempo dominando a máquina pública. Na próxima eleição o Lula voltará a concorrer como o legítimo artífice da ascensão petista ao poder, quando teremos um embate de titãs entre as duas maiores lideranças populares surgidas na redemocratização do pais: Lula Silva x Marina Silva.
Como brilhantemente escreveu a repórter Eliane Brum, OS SILVA SÃO DIFERENTES: Lula e Marina, os dois fenômenos políticos mais fascinantes da história recente, são filhos de Brasis que se desconhecem. Há uma ideia no Brasil de que os pobres são todos iguais. Ela explica a afirmação de que Luiz Inácio Lula da Silva e Marina Silva têm biografias parecidas – e a de que Marina teria sido a sucessora mais natural de Lula. Para chegar ao poder num país desigual como o Brasil, Lula e Marina fizeram uma travessia impressionante, uma espécie de jornada de herói. Mas as semelhanças acabam aí. Há enormes diferenças entre a trajetória de um filho de sertanejo que fez o caminho de São Paulo e se tornou operário e depois líder sindical, na região mais industrializada do país, e a trajetória de uma filha de seringueiro, seringueira ela também, na floresta amazônica, que iniciou sua carreira política em um estado como o Acre. Para alcançar a riqueza desse momento histórico do Brasil é preciso compreender que os Silva são diferentes.
Quando candidato, o operário metalúrgico era desconstruído por não ter escolaridade de nível superior e não dominar a chamada língua culta do país. A evangélica candidata tem sido desconstruída por suas limitações teológicas no campo científico da genética de células tronco e também na área dos comportamentos sociais, tais como na questão do aborto e da homossexualidade. Mas a defesa do meio ambiente planetário há de ser algum dia uma distinção inconfundível de racionalização da política e da vida!... A seca causando falta de água para a população de São Paulo não pode ser tratada como um mero acaso dos caprichos da natureza, a falta de chuva é notoriamente uma consequência direta do desmatamento na Amazônia. A Grande Onda Verde de produção e consumo sustentável é o sonho possível de ser sonhado hoje por nós, juntamente com os nossos filhos, como uma preocupação de minimizar a depredação da qualidade de vida dos netos dos nossos netos.
Ao fim e ao cabo desta eleição, poderemos dar continuidade às inovações no quadro político mundial. Depois da eleição de um negro nos EUA, de indígenas que assumiram o governo de países na América do Sul, de um operário na presidência do Brasil, da primeira mulher presidenta, poderemos apresentar ao mundo a primeira mulher negra no comando de um país com a maior população de negros fora da África. Assim caminha a humanidade...