O Meu Discurso de Rei Gago

          No filme O Discurso do Rei pude me identificar com o drama do personagem que é baseado no caso real do Rei George VI da Inglaterra, casado com a Rainha Mãe e pai da atual Rainha Elizabeth II, cuja gagueira era bem maior do que a minha. Com 12 indicações para o Oscar 2011, o filme ganhou ontem os quatro principais prêmios da Academia de Hollywood: Melhor roteiro original, melhor diretor, melhor ator e melhor filme!
         No mês de maio de 2010 postei um texto aqui no blog, intitulado O Qui-qui-qui, referente a um apelido que eu havia ganho no movimento sindical devido à minha gagueira que se agravava quando discursava para grandes públicos. Naquele texto assumi o seguinte resumo como sendo o descritivo do meu perfil hoje em dia para colocar no facebook: Vejo mal, ouço pouco e falo com dificuldades; mas em compensação agora estou escrevendo tudo!!
Comentei também que quando eu estava cursando jornalismo (fala sério, fica mal um repórter gago fazendo entrevistas, né?) cheguei a frequentar o consultório de uma fonoaudióloga por uns três meses. Consegui parar de dizer “tlês” (feito o Cebolinha), pois aprendi a soletrar o “três” somente com mais de quarenta anos de idade. Mas não tive persistência para desenvolver técnicas de domínio da gagueira, até porque tive que abandonar o jornalismo e não fui forçado pelas circunstâncias a persistir, como o Rei Gago da Inglaterra que teve que dominar a sua gagueira para poder transmitir um discurso convocando todo o seu império a entrar na Segunda Guerra Mundial contra a Alemanha de Hitler.
           O curioso é que, pensando em aproveitar o gancho do filme para  fazer um texto sobre o tema da gagueira, enquanto procurava nas minhas papeladas as folhas dos exercícios trava-língua que a fonoaudióloga Zulmira Martinez me dava para praticar (tipo: o ladrão apedrejou o vidro da vidraça da drogaria, o malandro era da quadrilha Metralha de Madri, mas sua trama teve final dramático na madrugada, traficando drogas trôpego de drinques...) encontrei um texto “prontinho” que fiz sobre o tema naquela época, datado de 2002, aos 48 anos de idade, onde me revelo assustado  com a proximidade de me tornar um “cinquentão”. Texto que veio a calhar e me poupar este esforço de  re-elaborar esta questão  da gagueira que permaneceu intocada de lá prá cá:
Sociologicamente aos 50 anos inicia-se a terceiridade? A expectativa de vida hoje em dia, especialmente a dos gaúchos, supera os 80 anos. Tenho, portanto, mais 30 anos pela frente, quase um outro tanto deste  tempo já vivido, principalmente se descontarmos os 20 primeiros anos, como fases preparatórias que são para o início da longa e solitária caminhada de cada um de nós no rumo de nossos próprios pés. Até mesmo a nova legislação brasileira sobre previdência, recentemente atualizada, ao contemplar a aposentadoria como um direito às pessoas com 53 anos de idade (que já subiu para 60 anos!), acaba por estabelecer esta faixa etária como um divisor de água entre os “novos” e os “velhos”.  Se ao entrar-se na segunda metade, na parte descendente da curva da vida, e ainda persistir latejando nas  têmporas a pergunta que não quer se calar (afinal, quem  sou eu?), então é hora de se redirecionar as buscas para que haja uma interiorização profunda e definitiva, a fim de se promover o encontro entre corpo, alma, espírito, consciência, ego, superego, id e todas as outras entidades que povoam o universo de cada um. É hora da promoção da unidade, do equilíbrio e da serenidade para assumir-se construtivamente a aposentadoria: a tão esperada alforria dos horários e trabalhos forçados e desinteressantes. Portanto, a partir de agora,  minha chance é a de me mover em direção aos outros, externar o que sinto e permitir que os outros me vejam como sou (aí é que entrou o blog!); me permitir uma abertura de interação e enriquecimento com os outros, me permitir ser uma consciência integrada com as demais consciências do universo; me permitir dar vazão e sair em busca, com tudo, daquilo que anseio...”; me permitir romper com a sina de consciência solitária.
Quando jovem, eu costumava dizer que “ouvia pouco, enxergava mal e falava com dificuldade”. Ao longo da vida, movido por necessidades imediatas, fiz uma cirurgia de timpanoplastia que corrigiu a audição e passei a usar óculos a partir dos vinte e poucos anos de idade, mas continuei falando com dificuldades. Contra a minha gagueira nunca tinha havido antes alguma motivação imediatista que me levasse a buscar uma ajuda especializada. A gagueira nunca me diminuiu nem me impediu de nada, mas sempre me incomodou, como uma pedra no sapato, sem que houvesse uma trégua suficiente na longa caminhada para que eu prestasse atenção nela.
          Também a interiorização profunda precisa de motivações imediatistas para conseguir arrombar tempo, espaço e priorização financeira para se realizar nesta nossa cultura e estilo de vida ocidental. Considerando que não tenho nenhuma deficiência orgânica, conforme me foi atestado finalmente pela fonoaudióloga, compreendi que a gagueira é um sintoma manifestado justamente para chamar a minha atenção para a existência de um “nó emocional” que engasga a minha comunicação com os outros. A gagueira é a minha atual motivação imediatista que me move na busca de uma interiorização profunda, que me move para assumir o esforço de ir lá no fundo do poço resgatar a resposta perdida da pergunta “quem sou eu?”. Isto porque agora me interessa evoluir enquanto consciência que se comunica harmonicamente, me interessa deixar de ser uma consciência solitária no universo.
            Em que mares procurar a ostra com a pérola perdida? Certamente nos mares do inconsciente, lá onde estão afundados todos os nossos navios desta vida, da vida intra-uterina e de nossas vidas anteriores, possivelmente. Em que submarino fazer este mergulho com segurança e objetividade? Vamos devagar, vamos por partes, como dizia o Jack Estripador. Primeiramente vamos desenvolver as habilidades exploratórias  fundamentais no interior da cápsula de um consultório de terapia de revivências transpessoais (TRT), como em aulas práticas de mergulhos orientados e supervisionados por uma psicóloga iniciada na contracultura da vida além e aquém do aqui e agora. Nada que os tibetanos já não façam a séculos, apenas que com uma objetividade imediatista própria das terapias. A missão da terapia é buscar, nas práticas de revivências de épocas e vidas passadas, os momentos cruciais que deixaram gravados em nossa essência imutável (imortal) alguns mandatos. Mandatos estes que, como sentenças, maldições ou carmas, vamos cumprindo como autômatos, ao longo das sucessivas existências ( como pode ser o caso da gagueira), até que as suas misteriosas causas sejam revisitadas e seus mistérios desvendados. Assim, como que por um passe de mágica, desatando-se os nós dos complexos emocionais que executavam os mandatos, o indivíduo obtém a cura. O processo de cura é exatamente o mesmo da terapia tradicional, seja ela freudiana ou não; a diferença está essencialmente no método de localização das causas dos nós emocionais. Na terapia de regressões o sintoma, para o qual se busca a cura, orienta o inconsciente nas expedições de buscas para a localização expedita dos eventos vinculados com aquele sintoma, enquanto a consciência meramente assiste e vai registrando  tudo no diário de bordo. Já na terapia tradicional todo o processo de localização das causas se dá, basicamente, através de pesquisa da consciência sobre a memória emocional ou factual. Além da terapia de revivências ser potencialmente um veloz atalho para se chegar às causas, por se orientar pelas emoções e não pela razão, em  muitos casos, quando estas causas são ocorridas antes do nascimento, inacessíveis à razão, é  de fato a única terapia com ferramentas eficientes para produzir a cura.

         Mas, de qualquer forma, a falta de memória é um outro sintoma para o qual preciso buscar cura. Sendo este um dos fatores preponderantes que me fizeram optar por esta terapia, pois este sintoma dificultaria infinitamente a terapia convencional e não apresenta nenhum problema para a terapia de revivências transpessoais. Portanto, um dos fatores que me movem, repito, são as motivações imediatistas de buscar cura tanto para a gagueira quanto para a falta de memória (sendo que possivelmente os dois sintomas estejam de alguma forma vinculados). Mas há um outro fator preponderante que está por trás (e talvez por cima) destes todos: é o de encontrar a ostra com a pérola rara, com poderes de bola de cristal, que responderá definitivamente a pergunta “quem sou eu?”.
         Os mares do inconsciente humano são apenas praias do grande universo esotérico, em suas diferentes dimensões e níveis de consciência e energia; em suas imensuráveis potencialidades que, inclusive, possibilita a projeção extra-física do espírito humano. As questões filosóficas da vida, da morte e da articulação cósmica evolutiva destes estágios, são buscas mais amplas, menos imediatistas, mas que se impõem como pauta obrigatória deste renascimento cinquentenário: das cinzas da primeira metade fazer nascer o eu que sou eu verdadeiramente.

       Barbaridade, até havia me esquecido desta busca que havia feito com regressões a vidas passadas, experiência que este inesperado achado trouxe novamente à tona. Como nada acontece por mero acaso nesta vida, o fato de eu ter encontrado o texto transcrito acima justamente após assistir o filme O Discurso do Rei (Gago), do qual saí fortemente mexido e travado na minha gagueira, pode significar que eu tenha sido o Rei George VI – O Gago, numa encarnação anterior...acho que na minha aposentadoria vou ter que retomar a terapia de regressões a vidas passadas!...

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