O ÁLVARO E SUAS CASCAS DE BANANAS

Éramos quatro na sala, os quatro dinossauros da jaula de extinção. Com a saída do Jalba, ficamos em três. Agora, com a minha saída para o mundo encantado da aposentadoria, restarão apenas dois, até que se confirmem as profecias de que o local será emparedado e deixará de existir quando sair o último e apagar a luz.
Sobre os outros dois colegas de cela, o Jalba e a Catarina, eu já postei comentários e observações aqui no blog, falta apenas tentar descrever para vocês o quarto elemento do bando, o Engenheiro Álvaro Silveira Neto. Não é à toa que ficou por último, é figurinha  rara, de difícil apreensão!
Insuperável conversador ao telefone, capaz de manter diálogos de duração intermináveis, sempre calma e repetidamente, feito pingo d’água, até conseguir se fazer entender e ter a visão do outro bem entendida, o Álvaro é possuidor de um talento raro para a diplomacia. Onde todos nós nos estressamos e partimos para o ataque agressivo, o Alvinho vai comendo o mingau pelas beiradas, vai cozinhando o galo com sua risadinha de hiena esperta e sua paciência de monge tibetano e, via de regra, de tanto “rodear o toco”   acaba costurando outras alternativas não pensadas anteriormente por nenhuma das partes envolvidas no debate, por mais acalorado ou sonolento que seja.
           O cara é um exímio negociador, tanto com fornecedores e empreiteiros, como com os próprios funcionários, pois tem paciência e o dom de ouvir. Lembro de um caso que considero o mais emblemático  da habilidade que o Álvaro tem para desatar nós cegos se fazendo de desentendido, e fazendo com que o interlocutor repita até a exaustão o argumento do seu ponto de vista, mesmo que seja a formulação de um simples pedido. O caso emblemático trata-se de uma reivindicação antiga dos Técnicos Industriais da Manutenção, que sempre era recolocada na pauta de qualquer discussão  das escalas mensais de plantões para finais de semana e feriados, que consistia na alegação de que eles não tinham a obrigação de ficarem “à disposição” para atenderem chamadas de atendimentos noturnos, muito menos nas madrugadas. A tradição, desde sempre na Manutenção, é que os plantonistas ficassem em casa, sem ingerir bebidas alcoólicas, à disposição para chamadas emergenciais a qualquer hora, pois pode ser que uma hidráulica esteja parada e bairros inteiros estejam sem água. É uma atividade essencial de utilidade pública!
Sob esta bandeira de luta, as novas gerações de técnicos industriais, mais esclarecidos e sindicalmente politizados, faziam fortes trincheiras de enfrentamento com os engenheiros da DVM, fazendo questão de não serem encontrados nos horários que deveriam estar de “sobreaviso à disposição” em casa sem ganhar nada! Esta bronca se arrastava a mais de uma década, talvez duas, passando por vários Diretores (inclusive por mim), até que, na Direção do Engenheiro Álvaro, com seu jeitão de moscão, de quem não está entendendo nada, fez com que finalmente as lideranças conseguissem explicar o óbvio. Ou seja, que eles não estavam reivindicando que fosse autorizado o pagamento de “sobreaviso”, por saberem que isso não está legalmente previsto, mas queriam simplesmente que na escala de plantão fosse explicitado que eles estavam sendo convocados desde às 17h30 de sexta-feira até às 8hs de segunda-feira (para possível entrada na justiça futuramente?). Ah, é só isso?...Fácil, caso resolvido! A partir de então passou a ficar explícito nas escalas, a exemplo do que já era mencionado para os engenheiros de plantão, que a convocação  se estende às 24 horas dos dias escalados dos plantonistas. Pronto, dissolveu-se o conflito e todos depuseram as armas pela ação diplomática de quem provoca a repetição psicanalítica, até que seja ouvido o verdadeiro sentido do que as pessoas estão querendo dizer e que, via de regra,  não são bem entendidas.
          O Alvinho é um gremista atípico, pois apesar de ser fanático o suficiente para ser associado e assistir às partidas no campo e ainda carregar um adesivo com o emblema do Grêmio na traseira do seu carro, ele é o maior crítico do seu próprio time. Suas análises futebolísticas sempre destacam mais as deficiências do que as vantagens da equipe tricolor, ao que ele chama de realismo de quem olha o futebol com racionalidade. Por exemplo, ele é um cara que faz muito tempo que vem alertando que o goleiro de seleção Vitor é muito bom de chutes de dentro da área, aí ele é um gato e pego tudo; mas bolas de longe, chutadas da intermediária, ele aceita quase todas! E não é que ele tem razão...


           Nunca ninguém viu alguém conseguir tirar o Álvaro do sério, do seu jeito bonachão de ser, com seu contagiante bom humor mesmo sendo um benemérito polemista. Ele adora jogar “cascas de bananas” nas conversas, como costuma dizer o colega Tedesco, para provocar escorregadias discussões, geralmente a partir de temas que recolhe na sua imensa bibilioteca cultural que é composta exclusivamente pelos canais Discovery e History Chanel da televisão fechada:
- Qual a diferença entre segredo e sigilo? ... Assim ele começa uma polêmica.
          O Alvinho é também um grande frasista, adora lançar no ar frases que generalizem atitudes e situações universais, tais como:
-Os políticos não são seres de outro planeta, são como a gente deste planeta. Eles saem de entre nós.
-O macaco só não fala de esperto, para não ser feito escravo pelos humanos.
- O tempo é um esmeril! (Referindo-se à deterioração física das pessoas com a idade).
          Pra comprovar este perfil de fisgador humorístico de polêmicas forjadas, basta acessar o perfil do Alvinho no facebook, onde consta que a sua preferência política é a “direita mais extremada”, com a casca de banana da foto de Ronald Reagan. É mole?...Os colegas petistas beliscam direto!

           Então, e a última polêmica que  o Alvinho lançou, verdadeira casca de banana, diz respeito à derradeira estratégia de aposentadoria. Diz ele que, ao contrário do que eu e a maioria dos aposentaNdos pensa, é mais vantajoso primeiro se gozar o último mês de licença prêmio e depois entrar com o pedido de aposentadoria e ficar trabalhando os 30 dias previstos de espera para poder entrar de Licença LAA  (de Aguardando Aposentadoria), pois é mais um mês da grana do Abono Permanência que faturamos. Faz um certo sentido a tese do colega, pois tem lógica o seu argumento de que na renda anual ter-se-á mais um mês de Abono Permanência. Alega ainda que, pra quem já ficou 39 anos esperando para se aposentar, um mês a mais não é nada! Sentencia que considera abrir mão dessa grana uma burrice do sujeito aposentaNdo que tem o direito de  optar por gozar o mês de Licença Prêmio em casa, e só pedir depois a aposentadoria.

O argumento do Álvaro  tem lógica, por isso consegue estabelecer uma pseudo polêmica, mas não considero que seja  um bom argumento. O meu questionamento para ele sempre foi o seguinte: acho que é melhor não ganhar a grana sem trabalhar do que não ganhar a grana trabalhando! Explico: se entrar de licença prêmio e pedir a aposentadoria no mesmo dia, fico trinta dias sem trabalhar e sem  ganhar a grana do abono permanência e estou livre. Pela tese dele, se eu aguardar trabalhando os trinta dias regulamentares depois de pedir a aposentadoria,  vou ficar trabalhando sem  ganhar o famigerado Abono Permanência. Pela lógica dele, do acúmulo financeiro, o mais vantajoso é ficarmos faturando o abono permanentemente e não nos aposentarmos nunca! Esta, inclusive, tem sido a opção de um número cada vez maior de colegas que vão ficando indefinidamente...Mas não é o meu caso!

Contudo, a questão deste  anzol do Abono Permanência, que tem fisgado  cada vez mais gente para ficar trabalhando oito horas por dia por mera terapia ocupacional, como veremos mais adiante, tem outros aspectos que exigem a atenção e o estudo reflexivo dos aposentaNdos. Primeiro que existe uma decisão patronal  deliberada que, no momento que um servidor pedir a aposentadoria, significa que ele está declarando que não está mais interessado em permanecer e que está abrindo mão do abono, o que implica no seu corte imediato. Não precisaria ser assim, pois isto implica em perdas, posto que o processo de aposentadoria ainda é moroso. Dizem que já não demora mais de um ano, como no caso do colega Jalba, mas que pode demorar cerca de quatro meses, ou mais, dependendo do caso. Durante este período o servidor poderia estar “permanecendo” no trabalho a fim de ganhar o abono e evitar os prejuízos  decorrentes da morosidade processual no PREVIMPA.

Para esclarecer um outro aspecto deste assunto, fui pessoalmente até o instituto de Previdência Municipal de Porto Alegre (Previmpa), com a esperança de que a portaria de aposentadoria, saísse quando saísse,  fosse retroativa à data do  pedido de aposentadoria. Acontece que quando o abono é cortado dos nossos salários, significa que começamos a pagar integralmente os 11% da previdência, até que saia a bendita portaria. A lei, porém, estabelece que só se deve pagar os 11% de previdência sobre a parcela salarial que exceder ao piso de R$ 3.300,00. Assim, enquanto não for publicada a portaria de aposentadoria, os aposentaNdos ficam pagando “indevidamente” 11% também sobre este piso, o que equivale a um prejuízo de R$363,00 mensais no nosso bolso. São perdas causadas por conta da morosidade institucional do Previmpa e da “sacanagem” patronal que, mesmo tendo culpa na morosidade do processo por ser quem repassa  as informações funcionais dos aposentaNdos, corta de imediato a opção do requerente continuar trabalhando e ganhando o abono até a oficialização legal da aposentadoria. Ou seja, ao pedir a aposentadoria o sujeito é impelido a saltar fora!
Lamentavelmente, conforme fui informado nos guichês do Previmpa, a aposentadoria não é retroativa, portanto não temos a chance de recuperar este dinheiro pago ao fisco desnecessariamente. É de salientar, com todas as palavras, que isso só ocorre por imposição  dos  procedimentos gerenciais da administração municipal,  a qual finge não perceber o prejuízo que está causando aos seus servidores em final de carreira. É  com esta mesquinhez que trata os seus funcionários que a PMPA espera ganhar o prêmio de ouro no Programa Gaúcho de  Qualidade Pública, o PGQP neoliberal do Gerdau, como o Alvinho costuma parafrasear os discursos esquerdistas dos colegas do PT!

      Até tentei falar pessoalmente com o presidente Rigotti do Previmpa, o meu ex-colega de militância sindical, para registrar o meu protesto pela anormalidade deste quadro que está estabelecido como uma coisa inerente e normal. Porém, como das outras vezes que tentei, não consegui furo na agenda para conversar com o agora Poderoso Chefão. Mas, quando dei de cara com a portaria da aposentadoria do Rigotti sendo publicada no Diário Oficial Municipal, imediatamente enviei um e-mail provocativo ao novo “véinho aposentado”:
- Véio, aposto que o trâmite burocrático da aposentadoria do presidente do Previmpa foi muiiiito mais rápido do que será o meu!
          Ao que o malandro (que sempre foi bom de latinha!) me respondeu:
- Quero te dizer que estamos trabalhando pra demorar cada vez menos. Quando entramos em 2005, demorava em torno de dois anos do pedido até a concessão da aposentadoria. No último mês a média de tempo foi de 97 dias. Queremos até o fim do ano baixar dos 60 dias. Isto quer dizer que quem tem toda a documentação do cadastro previdenciário atualizado pode ter sua aposentadoria em 30 dias, porém os desorganizados fazem a média ficar mais alta . Portanto, véinho, dá uma olhada no teu cadastro. Assim, se o teu pedido sair rápido não me acuse de querer me livrar de ti depressa... arggh!...Beijo.
Contudo, não é feito só de lamentos este tema do corte do Abono Permanência. Por incrível que pareça, este corte também tem o seu lado positivo. Como o Abono deixa de entrar no contra-cheque na coluna das vantagens salariais (o que já era uma outra sacanagem que nos faz pagar imposto de renda sobre o abono!), logo haverá uma redução do desconto do IRPF, o que implicará um acréscimo no líquido que compensará as perdas provocadas pela morosidade no PREVIMPA e, depois do ato final, será um ganho permanente no salário que somado  ao desconto do piso  da previdência, praticamente equivale ao próprio Abono.   No final da história, analisando bem, o Abono Permanência resulta como sendo uma grande “empulhação” para a “barnabezada” ficar trabalhando praticamente de graça!
       Polêmicas à parte, mas nestas cascas de banana do Alvinho eu não caio e nem vou mais escorregar, contudo vou sentir falta. Como ele próprio costuma dizer, “preteou os olhos da gatada!”, pois terminou o meu tempo de dmaeano, estou entrando na reta final da última semana nesta tribo que tem figurinhas raras como o “Alvneto” (famoso logon do Álvaro Silveira Neto).
-Valeu Mestre Álvaro!

DIREITO DE RÉPLICA:
-----Mensagem original-----
De: Alvaro Silveira Neto
Enviada em: quinta-feira, 28 de abril de 2011 19:51
Para: Celso; Celso Afonso Machado Lima
Assunto: Bolg do Aposentado e não mais aposentando.
         Celso tentei e não consegui postar o comentário no Blog. Sendo assim aí vai ele entre aspas:
"Parabéns. Já consultei cigana, botei as cartas e nunca fui tão bem explicitado. As bananas eu comi todas, as cascas ficam ao meu redor para me proteger. As fotos foram bem escolhidas,  a do brinde com espumantes tiramos em um determinado dia útil, após as 17:30. Só faltou dizer que não sou mentiroso."
Alvaro Silveira Neto

O ROL DOS MEUS POEMAS FAVORITOS

         A esta altura da vida em que me encontro, conforme a gente vai envelhecendo, vai sentindo a necessidade de dominar, com maior profundidade, as coisas que gosta...vai daí que inaugurei alguns anos atrás uma pasta no meu computador intitulada  “Meus Poetas Preferidos”, e ali pensei em ir reunindo as poesias eleitas como as minhas favoritas.
Castro Alves
Acontece que leio poesia desde jovem, digamos a partir dos 20 anos de idade, quando passei, com um poder aquisitivo mínimo, a ter acesso a livros: nos balaios de oferta dos sebos e da Feira do Livro. Mas a minha leitura de poesia nunca foi sistemática, tipo de cabo a rabo, pelo contrário, gostava de abrir e ler aleatoriamente os poemas de um determinado volume que estivesse fazendo sua temporada como “livro de cabeceira” de minha cama, de modo que ele nunca era dado por lido e arquivado em definitivo na prateleira. Era um sistema de permanente rodízio de poetas na minha mesa de cabeceira, com os mesmos livros podendo retornar de tempos em tempos. Por lá passaram Castro Alves, o modernista Mário de Andrade e, especialmente, o poeta maior do Brasil, Carlos Drummond de Andrade, com várias obras. Depois me descobri em Fernando Pessoa, ainda hoje a minha melhor tradução, e segui como um beija-flor descobrindo e sugando o néctar de outros poetas, tais como Walt Whitman, Maiakóvski e Paulo Leminski. 
DOSAGENS DE POESIA          
Uma das minhas doses diária de poesia
É aplicada na cama, antes de dormir
Direto na veia, para eu entrar em estado de sonho
Querendo desacordar logo para no sono fugir
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Conforme progredia o meu poder aquisitivo, fui ampliando também meus horizontes linguísticos e, com uma visita turística à Cuba, dado os baixíssimos preços dos livros por lá, voltei carregado de Federico Garcia Lorca e Pablo Neruda, este se consolidando como a melhor tradução poética da minha alma latino-americana, com o  privilégio de ter o charme especial de fazer seus cantos gerais em língua espanhola, que me gusta mucho!  Segui assim sempre peregrino, fazendo estadias tanto por infernos, como em Rimbaud, como pelos jardins das Flores do Mal de Baudelaire, e na poética de Eliot: vastos são os campos e muitas as moradas da poesia.
         De maneira que o meu projeto inicial de ir reunindo num arquivo os poemas preferidos teve que sofrer adaptações de percurso. Decidi adotar um novo procedimento de leitura, buscar ler a obra completa de cada poeta preferido e ir assinalando os meus poemas favoritos. Assim, a partir no ano de 2006, em que li o livro Toda Poesia de Ferreira Gullar, passei a selecionar as poesias que constituirão a Coleção dos Meus Poemas Favoritos. Em 2007 passei todo o ano com o Quintana na minha cama, lendo do início ao fim sua obra completa com mais de mil páginas, e absorvendo em doses homeopáticas as pílulas poéticas deste poeta que tem o ponto de vista portoalegrense de percepção do mundo, de forma a levar seus efeitos medicamentosos até o coração e ao espírito. Do Ferreira Gullar selecionei vinte e duas poesias e dos quintanares recolhi noventa e um poemas para entrarem na coleção dos meus favoritos.

QUINTAIS QUINTANEIROS
Captar os tantos sapos e grilos
Que povoam os versos do Quintana
Pressupõe uma experiência de vida
Em que de fato tenha havido banhados
Nas vizinhanças da infância do leitor
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No ano seguinte dei continuidade  ao propósito de mergulhar na obra completa dos grandes poetas, levando-os para a minha cama, mas a partir de então apenas em matinais doses diárias de poesia, uma vez que o outro horário que também era destinado para leituras poéticas, o horário noturno de deitar-se para dormir no final da jornada diária foi ocupado por um novo propósito, igualmente envolvente, que é o de fazer  silenciosa meditação budista  de forma cotidiana, para silenciar a mente e facilitar a conexão com o sono.

         Assim, no ano de 2008 a minha mesa de cabeceira foi ocupada pelo livro Obra Poética – Volume Único de Fernando Pessoa. Após saborosas leituras matinais, resultaram selecionados 122 poemas para o rol dos meus preferidos, mas sabendo que cada leitura que se fizer de um grande mestre como o Fernando Pessoa resultaria uma lista diferente de poemas escolhidos, dependendo de cada momento do próprio leitor. Acato, pois, os comentários do poeta e de seus múltiplos heterônimos: Navegar é preciso; viver não é preciso: Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
         Necessariamente, porém, navegar em Fernando Pessoa é preciso, e eu naveguei toda a mensagem de sua travessia poética!...
PESSOA ÍNTIMA
Que Pessoa é esta na minha cama
Que fala do amor e de Deus
E sobre a vida e a morte dos meus “eus”?
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O poeta escolhido para poetizar as manhãs de 2009 foi o Carlos Drummond de Andrade; o volume único de sua “poesia completa” chegou à minha mesa de cabeceira vindo de João Pessoa na Paraíba, via internet na rena do Papai Noel, por estar absolutamente esgotado em todo o país. Com 1.600 páginas, o dobro de Fernando Pessoa, este convívio com o mestre de Itabira, o grande Drummond, como era de se esperar, se prolongou por todo o 2010 e adentrou 2011, e  continua  fornecendo novos títulos de poemas para se integrarem aos meus favoritos, já totalizando até o momento mais de oitenta poesias selecionadas como tal...
O próximo poeta que levarei para a cama já está escolhido, será Pablo Neruda, para cuja vasta obra em língua espanhola poderei dedicar outros espaços diários do meu cotidiano, uma vez que estarei aposentado,  terei mais  tempo para fazer calmamente a colheita de versos nerudianos para o rol dos meus poemas favoritos.
Poeta Celsol
POETEIRO
Não é que eu seja um convencido
Mas relendo meu último livro de poemas
Entrei pro rol dos meus poetas preferidos
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Todos estes poeminhas estão nos meus  livros  de poemas INDAGAÇÕES POÉTICAS e ELOS, que têm link de acesso disponíveis na Minha Lista de Blogs do Menu desta página. Em todo caso, para poupar tanto esforço, disponibilizei aqui mesmo os links para vocês darem uma espiadinha:

Para encerrar com interatividade, passo um tema de casa: leia em tom declamatório o verso abaixo e depois o localize em um dos meus blogs de poemas, comentando qual é o seu título:
O Solitário processo de poetar
É viver a poesia do que se faz
Fazendo poesia do que se vive
É indagar vivendo as indagações!
Valeu!

OS EXPURGADOS DO PT

        Como  eu havia prometido na postagem anterior sobre eleições de chefias, vou contar para vocês como um petista de bandeirinha foi levado a pedir a sua desfiliação partidária. Transcrevo a seguir um texto que escrevi no naquele traumático ano de 2003:
Apenas um ano depois das grandes comemorações da vitória eleitoral e da posse do Lula como Presidente do Brasil, do emocionante coroamento de uma geração que dedicou a sua melhor energia para a construção deste sonho (quase impossível) de fazer um partido dos trabalhadores tomar as rédeas do poder para corrigir o rumo do curso deste país, foi  decretado pelo tribunal do Diretório Nacional do PT que o sonho acabou!

Nesta data, 14 de dezembro de 2003, ao serem expulsos do PT os deputados federais João Fontes (SE), Babá (PA) e Luciana Genro (RS), juntamente com a senadora Heloisa Helena (AL), indiretamente também ficaram expurgados do partido todos aqueles que, se pudessem votar na Câmara dos Deputados ou no Senado Federal, votariam contra a Reforma da Previdência, tal como ela foi encaminhada pelo executivo e aprovada pelas duas instâncias legislativas. Seria covardia nos omitirmos desta leitura dos fatos, fingirmos que não é conosco, que não temos nada a ver com isto e continuarmos sonhando.

        Não há brasileiro politicamente consciente que não estivesse convencido de que são necessárias as reformas, na Previdência especialmente, mas qual reforma? De que forma democrática se construiria um consenso sobre os sacrifícios e perdas a serem socializados, respeitados os direitos adquiridos ao longo da vida das pessoas? Todos, certamente, estariam dispostos a ceder mais um pouco, dentro de um projeto que sentissem firmeza, que mobilizasse a nação para uma arrancada triunfal da brasilidade.
      Mas, para desespero e desilusão de todos que acreditavam que o sonho  estava tendo um final feliz, se percebeu que o “sapo-barbudo” que virou “príncipe-presidente”, com o beijo do poder, se transformou num  “bicho-papão” para amedrontar os servidores públicos e os velhinhos (por enquanto, pois já dá medo o que nos espera na anunciada Reforma Trabalhista, com toda esta disposição governamental para fazer o serviço sujo de algoz dos assalariados), sob a égide  da doutrina neoliberal do “Estado Mínimo”.

Bem diziam os antigos que o poder transforma. Fomos ingênuos e idealistas em acreditar que isto não aconteceria conosco, que com o PT seria diferente. Com as mesmas práticas políticas dos partidos tradicionais, em nome de uma dócil governabilidade, rapidamente se revelaram os “caciques” que construíram um leque de “partidos aliados” para, em troca de ministérios,  garantir uma maioria legislativa. Sem uma oposição verdadeiramente identificada com as causas populares, papel até então desempenhado pelo próprio PT, que agora mudou de lado, ficou fácil assumir a continuidade do governo FHC, encaminhando de maneira piorada (pela prepotência de uma conjuntura favorável à aprovação de qualquer barbaridade decretada pelo executivo) as mesmas reformas que o próprio PT já havia rejeitado reiteradamente no governo anterior. Se antes eram “trezentos picaretas” no Congresso, conforme dizia a música dos Paralamas do Sucesso, agora são quatrocentos.
É com profundo sofrimento que sou forçado a reconhecer que o sonho acabou, e que está pesado o sono pra quem não acordou (parafraseando uma antiga canção do Ministro da Cultura Gilberto Gil).
           A geração anterior à minha na atuação político-partidária, que mais diretamente fez o enfrentamento com a ditadura, se autodenominou “Geração Amordaçada”, pelos 20 anos de repressão e de silêncio que vivenciou. Penso que, analogamente, a minha geração poderia se denominar “Geração Sacrificada”. Sim, pois é a segunda reforma da Previdência que ela sofre (a primeira foi em 1998 com o FHC, quando houve a instituição da idade mínima de 53 anos para homem e 48 anos para mulher, com um pedágio de 20% de acréscimo no respectivo tempo que faltava para cada um atingir 35 anos de trabalho). Só aí já foram imputados mais dois anos de trabalho nas minhas costas, eu que estava pronto para me aposentar aos 51anos de idade!
         Além das perdas financeiras de direitos imediatos, esta geração sacrificada foi penalizada com uma pena sobre a outra, totalizando um acréscimo de dez anos de serviços forçados, além dos trinta e cinco anos que já estavam pactuados a mais de trinta anos. Há milhares de pessoas que serão penalizadas por faltar um mês, uma semana ou até um dia para completarem o tempo de 35 anos (mais o pedágio) de trabalho ou os 53 anos de idade.
       Propor regras de transição não seria uma atitude natural para se evitar estas injustiças generalizadas e para se respeitar o direito de quem começou a trabalhar mais cedo, para que possam se aposentar um pouco antes de quem começou mais tarde? Fazer esta exigência mínima é ser radical? É ser fundamentalista? É ser corporativista ou demagogo, ou tantos outros rótulos pejorativos que o revelado novo “Rei da Mídia”, o “Lula-marqueteiro” difundiu com suas célebres metáforas? É justo que os “filhinhos de papai”, que só começam a trabalhar depois de formados na faculdade, lá pelos 25 anos de idade, se aposentem junto com os filhos dos pobres que são obrigados, pela necessidade, a começaram a trabalhar ao 15 anos de idade?
      Por incrível que pareça, uma das causas do “expurgo de nós petistas” é a de exigirmos regras de transição na Reforma da Previdência. É o tempo de vida das pessoas que o Estado está arbitrariamente se apropriando, ao mudar as regras aos 40 minutos do segundo tempo de nossas vidas!

        Sem demonstrações técnicas convincentes para a adoção dos critérios da reforma, utilizando-se da velha esperteza sofística de manipulação dos números e informações populistas, o PT ludibriou a sua principal base de apoio nesta sua escalada ao poder, que foram os servidores públicos (municipais, estaduais e federais), traindo a confiança e a esperança de que “um jeito melhor de fazer as coisas era possível”. O fato é que o Palácio do Planalto foi apedrejado e a lua de mel do governo Lula com o povo brasileiro acabou bem antes de transcorrer um ano de “paz e amor”.
       Particularmente não me restou outra saída, que não a de me considerar um “expurgado”, até por uma questão de responsabilidade histórica. Toda a minha militância política foi desenvolvida dentro da categoria dos funcionários públicos, onde tenho consciência que influí no engajamento de muitos colegas nas bandeiras de lutas defendidas pelo PT, aos quais só me resta pedir desculpas pelas perdas e desenganos que, ingenuamente, os induzi pela convicção de minhas posturas políticas. Com que cara iria desculpar-me e aliviar este peso da minha consciência, senão com a penitência de assumir-me como um expurgado, de ostensivamente não compactuar com esta guinada de rumo?
Fórum Social Mundial:
            A pior conseqüência deste fulminante desencanto com o governo petista, é de recairmos, novamente, na absoluta descrença em relação aos partidos políticos, credibilidade esta que o PT levou tantos anos para construir e, até então, era o único a possuir tamanho patrimônio junto à população em geral. A coerência entre o discurso e a prática era o diferencial petista. Pessoalmente eu já havia sido excluído partidariamente, nos últimos dois mandatos da Administração Popular na Prefeitura de Porto Alegre. Até então, convivia bem com esta situação de excluído aqui, em nível municipal, mas vinculado às macro-questões em nível nacional, com fidelidade às teses e bandeiras que sempre defendemos. Mas agora estou sendo definitivamente expurgado pelo comando nacional do PT, pelo governo do meu partido, em última instância, pelo meu presidente, por aquele que me levou às lágrimas no dia da vitória e no da sua posse.

        A vida é um constante aprendizado. Com esta dura lição só me resta encerrar o meu ciclo de militância sociológica. Este melancólico encerramento do meu “ciclo de vínculos sociológicos”, ao completar os 50 anos de idade, é uma difícil passagem, com o drama de ser expurgado justamente daquilo que mais intensamente me envolvi em toda a minha vida. Foi a minha seita de ateu materialista! Lembro especialmente dos áureos anos da democratização do país, das Diretas Já!, das campanhas eleitorais majoritárias desde 1982, até o primeiro gostinho de vitória em 1989. Foram vinte anos de boca de urna no colégio eleitoral ESEF-UFRGS, juntamente com os antigos companheiros do lendário Núcleo Jardim Botânico do PT, dos utópicos tempos dos núcleos de base em garagens e porões.
       Felizmente, neste momento de encerramento do meu ciclo sociológico, tenho o consolo de estar iniciando o Curso de Filosofia na UFRGS, que me propõe um novo ciclo surgido das cinzas do anterior, como uma fênix. Ciclo de estudos aprofundados dos porquês: por que as pessoas e os partidos se comportam de maneira completamente oposta, conforme estejam no poder ou na oposição?...

        Por tudo o que já vi e ouvi ao longo destes quatro mandatos do PT na Prefeitura de Porto Alegre, com mais esta paulada federal, o meu rompimento com qualquer ligação partidária mais orgânica é irreversível e tardio. Viva as comunidades alternativas e voluntárias! Viva o Fórum Social Mundial! Viva Raul Seixas! Viva o Anarquismo!
       Filiação partidária é como um casamento. Neste matrimônio, porém, houve um processo litigioso, em que a cúpula do PT decretou o divórcio unilateralmente, com a sentença de abandono do lar por parte dos inconformados. Nestes termos não há mais clima para se buscar uma reconciliação, pois quebrou-se o encanto do sonho da felicidade conjunta. Na melhor das hipóteses, superadas as mágoas com o tempo, poderemos, quem sabe, “ser bons amigos simplesmente, mas coisas do amor nunca mais”.
         O resgate da minha liberdade ideológica eu vou buscar no cartório eleitoral, solicitando a minha desfiliação do Partido dos Trabalhadores, em cumprimento ao expurgo decretado pelos donos do poder. Também vou providenciar a transferência do meu título eleitoral e sair da Zonal-113, página virada:
-Adeus companheirada de boca de urna do NúcleoJB, valeu!
        Naturalmente que vou continuar torcendo para que o governo petista encontre o seu verdadeiro rumo, e não desperdice esta fantástica oportunidade que o povo brasileiro conquistou democraticamente, e que consiga apresentar no final do mandato um saldo construtivo real, e não meros índices numéricos que a realidade das ruas e campos não reflitam como concretos, como sempre fizeram os governos anteriores.
        Espero - a esta altura já por um milagre - que efetivamente ocorra o anunciado “espetáculo do crescimento”, para que, com “fome-zero”, eu possa aplacar esta gana raivosa que sinto de rasgar com os dentes e mastigar a minha velha e surrada bandeira do PT por tanta decepção.
...Ufa!, que desabafo foi este texto, hein?! Constato agora em 2011, oito anos depois da desfiliação, que no final até que  houve mesmo o milagroso espetáculo do crescimento durante a Era Lula, né? E, depois de muito jogo de empurra e milhares de desfiliações de petistas históricos,  também foram aprovadas as reclamadas regras de transição na  reforma da previdência pública, através da PEC do Senador Paim, que ao invés de  eu ter que trabalhar mais sete anos, tive que trabalhar apenas mais três anos além dos dois a mais do FHC. Apenas?! Vá lá, agora já foi!... No final da Era Lula (que ainda  sujou as mãos, não só com o petróleo do pré-sal, mas também com  o escândalo do Mensalão), uma vez passada a dor de cornos e a do desencanto, acabamos ficando amigos  simplesmente: depois de eu votar nulo na reeleição do Lula Lá, voltei a votar  no PT (no 2º turno, é claro!) pela continuidade do petismo pmdebista de Dilma/Temer & Sarney! Que escolha?!... 
Valeu!

AS ELEIÇÕES DE CHEFIAS NO DMAE

          Como eu dizia na postagem anterior, esta tensão entre chefias e subordinados gerada pela introdução do indicador gerencial de avaliação funcional me reportava a uma passagem marcante da história recente do DMAE, que foram as famigeradas “eleições de chefias”. Até havia me espantado: Oh! Meu Deus! Não é tão recente assim, foi em 1989, já faz mais de 20anos! Parece que foi ontem...

          Naquela época, foi o ano que o Partido dos Trabalhadores assumiu pela primeira vez a Prefeitura de Porto Alegre (que se estenderia por longos quatro mandatos), eu era a referência petista de maior tradição na militância sindical no DMAE. Tanto que, dos quatro superintendentes que assumiram na Administração Guilherme Barbosa, dois foram por indicação minha; isso por que eu próprio não podia assumir por não ter curso superior completo (e, por ironia, eu ainda não tinha completado o curso de engenharia justamente por causa da minha militância de entrega total à causa político-partidária) e não tínhamos quadros do partido para preencher os cargos.
        Contudo, eu fui trabalhar no primeiro escalão, na tropa de elite do Diretor Geral, compondo um grupo de assessoria especial, reunindo na mesma sala as seguintes figurinhas: O Dieter como assessor técnico (o cara que depois assumiria como DG com a eleição do Guilherme Barbosa para vereador), o Eron Estrela como assessor jurídico, eu como assessor sindical e a Fátima Silvello como assessora comunitária.
        Tudo correu bem, na maior calmaria, no primeiro semestre, período em que os CCs puros tomaram pé da situação, começaram a conhecer “quem é quem” e a dominar como funcionava a máquina de fabricar água e coletar esgoto que é o DMAE, com seus dois mil e tantos funcionários.
           Acontece que, especialmente na área de tratamento/pesquisa e na comercial, os jovens servidores petistas (muitos possuidores de curso superior mas não nomeados como tal) tensionaram as relações com as chefias durante a campanha e a ascensão do PT ao poder e, após, continuavam sem espaço na administração petista, cujas chefias continuavam com os mesmos de antes. Passado o medo do novo, de desestabilizar a administração pública por falta de experiência dos quadros petistas, de repente, o DG fez um acordo com o SIMPA, vale dizer, com o colega Édson Zomar (que havia se revelado nos últimos anos como uma nova grande liderança sindical dos setores mais operários do Departamento), para a realização de eleições de chefias em todas as Divisões do DMAE.
         Podem imaginar que alarido repercutiu pelos corredores e pavilhões do DMAE o anúncio desta decisão da Direção Geral. A casa caiu! Imediatamente três superintendentes apresentaram pedido de demissão coletiva. Era a revolução operária que estava por chegar! Como diria o Nei Lisboa: 89 foi bala!...
          Bueno, eu que estava cedido extra-oficialmente com a minha FG de seção da DVM para trabalhar como assessoria do DG lá em cima, no corredor do poder, ou seja, eu que continuava ganhando exatamente a mesma coisa que antes do PT, com as eleições de chefias decretadas tive que voltar para o meu local de trabalho original para concorrer na eleição à minha função gratificada de chefia da Seção de Manutenção Preventiva, pelo menos até conseguir incorporá-la ao salário.
           Foram realmente momentos revolucionários aqueles, houve assembléias gerais no Auditório Araújo Viana para aprovação do Regimento Eleitoral Único do DMAE, e foram estabelecidas Comissões Eleitorais eleitas em cada Divisão: Era a República Soviética do DMAE! Até os cargos em comissão mistos ficaram sujeitos à votação. Estas comissões funcionavam como sovietes (conselhos operários), com poder de organizar internamente quem estaria vinculado a quais chefias nas quais poderia votar e ser votado, comissões estas vinculadas ao Soviete Supremo que era a Comissão Coordenadora, com três membros indicados pelo Fórum de Representantes, um membro pelo SIMPA e o outro pelo DG. No processo eleitoral houve a eleição da instância máxima que era o Fórum de Representantes (O Politburo), o qual era composto por delegados eleitos em Assembleias Gerais das Divisões, cujo critério de proporcionalidade era que para cada 50 funcionários da Divisão indicavam um representante. Foi uma loucura formidável!
           Sei que fui eleito para a Comissão Eleitoral da DVM e também para continuar exercendo a minha função gratificada, para onde voltei determinado a me dedicar à causa de conseguir o meu canudo de curso superior completo. Como de fato, após ter ficado por dez anos marcando passo, abandonando uma por uma as disciplinas em que me matriculava, para “dar prioridade ao movimento de organização da classe trabalhadora na redemocratização do país”, com apenas mais dois anos focados no curso me formei em engenharia, finalmente! Confesso que foi duro ver oportunistas se locupletando e quem construiu a idéia do petismo desde a sua fundação ficar de fora, chupando o dedo e assistindo a coisa toda, pelo que tinha dedicado vários anos da minha vida, se deturpar... Mas isto já é uma outra história que me levou à minha desfiliação do PT dez anos depois, por ocasião da reforma da previdência do Lula Lá presidente, que eu conto um dia desses para vocês.
             No DMAE as eleições foram realizadas em todos os níveis de chefia até o Diretor de Divisão inclusive, para um mandato de um ano. Assim, como pelo regimento todo ano haveria eleições, na campanha eleitoral começaram a surgir articulações tipo rodízio “vamos votar no Fulano neste ano e no ano que vém é será a vez do Beltrano ...”, ou pior, “vamos votar no Ciclano que é dos nossos só para derrubar o atual chefe que é muito Caxias”! E, depois de eleito, se o Diretor Geral quisesse cassar o mandato de um chefe teria que submeter seus argumentos ao Soviete Supremo e a uma Assembléia Geral da Divisão do dito cujo. Era a democracia participativa do assembleísmo da Grécia Antiga funcionando no meio operário pós-moderno.
            Qualquer pesquisa de clima no quadro funcional daquela época indicaria o ambiente feito um caldeirão que ferveu muito naquele três meses em que decorreu todo o processo eleitoral. Havia muita tensão entre as chefias em exercício, as quais se viam ostensivamente ameaçadas pelos seus subordinados que se insubordinavam por conta do movimento bolchevique de tomada do poder: através do voto os oprimidos seriam eleitos como os novos chefes! As coligações eleitorais naturalmente que recorriam ao apoio de entidades de classe, como o próprio SIMPA, para desenvolver estratégias visando os cargos mais concorridos, como os de Seção, Serviço e Diretor de Divisão. O jogo ficou pesado em alguns locais.
          Tudo isso dava gosto de ver acontecendo, por ser até então inimaginável, e por vivermos permanentemente sob forte emoção revolucionária devido à tensão que havia entre as várias facções e visões ideológicas que se infiltravam com seus interesses nas disputas por espaços de cargos dentro da administração petista. Na DVT talvez tenha sido a Divisão em que ocorreu a maior cisão e que se manteve como um racha permanente durante toda a era petista. Houve até dispersão de muitos técnicos científicos para outras Divisões ou para o porão da Hidráulica do Menino Deus, histórico reduto de resistência que, com a queda do PT, foi transformado, como um monumento, no Gabinete do Diretor da DVT. São meras histórias peculiares, vistas assim de longe no tempo, sem os impulsos das paixões do momento em que eram vividas.
           Contudo, apesar da experiência de efetuarmos eleições de chefias em todo o DMAE ter sido muito valiosa em seus ensinamentos sociológicos, se mostrou demasiadamente intensa no acirramento dos ânimos e desestabilizadora da rotina operacional. Certamente que não era coisa para se realizar todos os anos, como queria a índole de militância revolucionária das jovens lideranças petistas municipárias, oriundas recentes que eram do movimento estudantil. Mas resultou sendo uma coisa para não se realizar nunca mais!
             Avalio que a decisão do Diretor Geral de acatar a proposta de realização de eleições de chefia no DMAE se deu por um interesse estratégico dele em provocar a ruptura do corporativismo estabelecido no Departamento. Penso que o Guilherme Barbosa sentiu a necessidade de abrir espaço para os servidores mais alinhados ideologicamente com a visão petista, os quais tinham ficado à margem devido à cultura vigente de que o DG escolhe os superintendentes e estes indicam os diretores e assim por diante. Como os superintendentes eram da Velha Guarda, sem vinculações petistas, nada mudou, ficaram os mesmos chefes. Com as eleições, além de conseguir dar um outro perfil na composição das chefias, de cima abaixo, pois até os superintendentes demissionários foram substituídos, a nova administração passou a dominar com absoluto controle todo o quadro funcional. Nem precisaria mais de sua antiga assessoria sindical, que era eu.
          Assim, uma vez conseguido o seu objetivo, não era mais de interesse da administração petista tumultuar sua gestão com novas eleições de chefias; de modo que nunca mais se falou neste assunto e tudo voltou à “normalidade” da calmaria de antes daqueles dias que pareciam tão revolucionários.
         Por isso, quando hoje os novos gestores falam em avaliação funcional de chefias, os mais antigos tremem nas bases e torcem o nariz, pois sabem que vem confusão por aí...

O CHÁ DE AVALIAÇÃO FUNCIONAL NO DMAE

          Lá pelo final de 2010 fui “convocado!” a participar de uma Oficina de Preparação para Avaliação do Desempenho Funcional, atividade promovida pela UNIDMAE (que é a antiga seção de treinamento da DVH rebatizada, na era da grandiloqüência, com o pomposo título de Universidade Corporativa do DMAE, com reitora e tudo!). Estas oficinas visavam oportunizar o aprendizado do método da avaliação de desempenho que será utilizado como ferramenta de gestão de pessoas, visando diagnosticar as diferenças entre o desempenho real e o esperado de cada servidor, proporcionando um canal institucional de comunicação entre chefia e servidor.
         O objetivo principal, segundo a UNIDMAE, é “Avaliar para Desenvolver”, pois o resultado da avaliação constituirá um Plano de Desenvolvimento Individual (PDI), obtido por meio de reuniões de consenso entre o gestor e o servidor, que estabelecerão ações de desenvolvimento com o suporte institucional da DVH, digo, UNIDMAE...

         Mas cá entre nós, que solo de violino virtuoso mais bem tocado este, parece vir das montanhas da Suíça com a Áustria: pauta de primeiro mundo!
         Resumindo, o método determina que todo mundo será submetido a uma avaliação por sua respectiva chefia. Os questionamentos que surgiram durante as oficinas diziam respeito, primeiro, para que servem de fato tanto envolvimento de pessoal e papelada burocrática de avaliações e, segundo, se estas avaliações seriam apenas de cima para baixo, ou seja, se as chefias também não iam ser avaliadas por seus subordinados.
         Peremptoriamente foi afirmado que, por enquanto, as avaliações são apenas para fins de desenvolvimento de planos de treinamentos, já que o projeto de Plano de Carreira, que contempla o critério de avaliação como um dispositivo de ascensão funcional, continua congelado ou engavetado. Por enquanto, também, as chefias não estarão em julgamento neste processo de avaliação, o que poderá ocorrer em outro momento através de outro formato de avaliação.
         O questionamento do público-alvo da oficina, e o meu inclusive, é que, como este processo de avaliação está gerando uma tensão tão grande entre avaliados e avaliadores, se vale a pena fazer tanta agitação para resultar em pífios planos de treinamentos que, na melhor das hipóteses, atingirão cerca de 10% do quadro funcional. É como mover uma montanha para aproveitar um punhado do seu conteúdo e ainda deixar relações degradadas pelo método!
         A réplica dos instrutores da oficina é de que, justamente por esta avaliação ser “apenas para fins de treinamento”, será uma oportunidade de se retirar a tensão entre as partes e treinar práticas de avaliações, por ser um indicador operacional consagrado de gestão de pessoal, portanto necessário para a qualificação do DMAE. É o famoso “CHA” de competências: Conhecer, ter Habilidade de fazer e ter Atitude de querer fazer (Conhecer+Habilidade+Atitude = CHA). O método consiste baiscamente na Avaliação da chefia e na auto-avaliação do avaliado e, principalmente, no cruzamento destas duas visões sobre competências e desempenhos, os quais devem chegar num consenso a ser assinado por ambos. Sem consenso, a DVH será acionada para intermediar. Será o momento mágico, consideram, de aparecer os problemas que estão embaixo do tapete do condicionamento hierárquico...
       Esta tensão entre chefias e subordinados me reporta a uma passagem marcante da história recente do DMAE, que foram as famigeradas “eleições de chefias”. Oh! Meu Deus! Não é tão recente assim, foi em 1989, já faz mais de 20anos! Parece que foi ontem...contarei o causo tim-tim por tim-tim pra vocês na próxima postagem deste blog: não percam o próximo capítulo!...