O ÚLTIMO DINOSSAURO DA MANUTENÇÃO

Éramos quatro na sala, os quatro dinossauros na jaula de extinção. Com a aposentadoria do Jalba, ficamos em três. Depois, com a minha saída para o mundo encantado dos “inativos”, restaram apenas dois na cela do Jurassic Park. Agora, com a saída da Engª Catarina, acreditem!, que entrou em Licença Aguardando Aposentadoria (LAA), restou apenas o Álvaro como o último Dinossauro da Manutenção do Dmae.
A Catarina e o Jalba  eram vinho de pipas de outras safras, mas o Álvaro e o Engº Souto (meu último Superindendente), mais o Engº Rogério de Menezes (meu último Diretor de Manuntenção) e eu, todos  entramos no Dmae no mesmo concurso público para o cargo de Escriturário em 1976. Por isso tínhamos matrículas quase sequenciais, tipo os os números dos irmãos Metralha. Com exceção do último Dinossauro, todos já estamos “extintos da ativa” e já percorremos os ritos dos aposentaNdos até o dia D.
 A última semana de “ativo” de um aposentaNdo é destinada literalmente ao bota-fora de pastas e da imensa quantidade de papéis recolhidos das nossas prateleiras e gavetas do  local de trabalho. É impressionante como se junta papeladas inúteis, coisas que se vai carregando na espera de surgir uma boa oportunidade de descarte, o que não chega nunca. Esta é a hora, às vésperas da aposentadoria, de se fazer o feng-shui final, de limparmos e desovarmos tanto os arquivos físicos quanto os virtuais.

            É tempo também de se dedicar a rastrear, pasta por pasta dos arquivos digitais no computador do DMAE, cautelosamente selecionando o que deve ser repassado para os colegas que vão dar continuidade nos serviços que competia ao aposentando. Nesse processo dos últimos dias, é claro, também se vai preparando o kit de viagem para a aposentadoria, empacotando os arquivos que interessam levar como “recuerdos”, especialmente o dossiê em mídias de fotos das caras dos colegas e dos locais do DMAE.  
Lembro que para a bagagem da minha viagem adquiri uma mala grande, ou seja, comprei um HD-Externo de 120GB para  acomodar meu breve histórico de registros digitais. Breve sim, por incrível que pareça, pois faz pouco mais de uma década que dispomos de computadores individualizados, embora pareça que esta tecnologia desde sempre existiu. Faz menos tempo ainda que dispomos de máquinas digitais de fotografias.
No último dia de trabalho, evita-se ao máximo ser emotivo. Lembro que no meu último dia, por desígnios dos astros, tive a oportunidade de participar de um ato público de protesto do Movimento dos Capacetes Brancos  dos Engenheiros, realizado na esquina do meu local de trabalho, onde pude despedir-me de vários colegas.
 A última hora do último dia, geralmente, o aposentaNdo dedica a percorrer os diversos recantos da Divisão de Manutenção, despedindo-se individualmente de cada colega. No final do expediente, tem a especial solenidade do último movimento desta formidável ópera de cumprimento ritual para se ganhar o direito a uma aposentadoria integral, qual  seja, o ato solene da última dedada no relógio ponto digital!

           Carrega-se consigo as tralhas que acumulamos durante todo esse longo tempo no nosso reduto onde passávamos 40 horas semanais; bem como carregamos as fortes influências de formação humanísticas das várias gerações de colegas com quem convivemos no Departamento. Então, partimos do convívio diário com os colegas, acreditando que há vida depois da aposentadoria, nesta transição do mundo dos ativos para o mundo dos inativos.
               O último dos Dinossauros, o Álvaro, é um benemérito polemista e grande frasista, adora jogar “cascas de bananas”  nas conversas, como costuma dizer o colega Tedesco, para provocar escorregadias discussões. Como jurássico é possuidor de um talento raro para a diplomacia, vai comendo o mingau pelas beiradas, vai cozinhando o galo com sua risadinha de hiena esperta e sua paciência de monge tibetano e, via de regra, de tanto “rodear o toco”, acaba costurando outras alternativas não pensadas anteriormente no debate, por mais acalorado ou sonolento que o assunto seja. Nunca ninguém viu alguém conseguir tirar o Álvaro do sério, do seu jeito bonachão de ser, com seu contagiante bom humor de dinossauro de desenho animado.
O evento do último dia de trabalho da Madrinha da “EME-DVM-GMAN”, no dia 11 de setembro, talvez não por acaso coincida com a data da queda das torres gêmeas, pois ela sempre foi o pilar técnico e afetivo que fundamentou estruturalmente a área de manutenção de equipamentos do Dmae. As profecias eram de que o local seria emparedado e deixaria de existir quando o último dos dinossauros  se aposentar, ao sair e apagar a luz...
Assim, cumprido o ritual do derradeiro dia útil de trabalho, rumamos para a liberdade incondicional da disponibilidade do tempo do resto das nossas vidas, sempre repetindo como um mantra íntimo de agradecimento:

 -Valeu pessoal, valeu DMAE!!!!!

2 comentários:

  1. Assim como adotei como madrasta a minha querida Porto Alegre , adotei como madrinha a Engenheira Catarina, que também acho muito querida e generosa.

    ResponderExcluir