PREPARAÇÃO DE APOSENTANDOS

Em junho passado não foi só o Brasil que tremeu de cabo a rabo com os manifestos dos jovens indignados com a hipócrita politicagem brasileira; eu também tremi ao aceitar participar como um aposentado a ser entrevistado no PPA2013 (Programa de Preparação para Aposentadoria) promovido pela SMA, programa dedicado a todos os servidores da Prefeitura de Porto Alegre em fase de pré-aposentadoria.
O encontro, mediado pela jornalista Cida Lopes, tinha também como entrevistado o bombeiro João Batista que, após se aposentar da Brigada Militar, estudou e se tornou psicanalista terapêutico: grande figura e exemplo! O debate com os aposentaNdos do PPA2013 reuniu, portanto, um representante dos que gostavam muito do trabalho que faziam e que desenvolveram outra atividade profissional após a aposentadoria, e eu, que cumpri burocraticamente a minha sentença de 38 anos de trabalho de maneira satisfatória, sem grandes realizações profissionais, e quero usufruir do meu tempo livremente sem  o vender mais como mão de obra em troca de dinheiro. Foi um debate que empolgou a galera!

Em maio passado em postei aqui trechos de uma entrevista que eu havia concedido a Gabriela Werlang, Graduanda em Tec. Recursos Humanos da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS – cujo trabalho de conclusão do curso era justamente sobre a importâncias dos PPAs nas empresas públicas e privadas. Então, a Gabriela se formou elaborando um belo trabalho sobre o tema da aposentadoria, que não posso deixar de compartilhar com os leitores, por ser um suporte teórico do tema central deste Diário de um AposentaNdo:
A aposentadoria é uma fase da vida que propõe uma reflexão acerca do que já foi vivido e o que ainda se pretende viver, mas por trás de suas possibilidades positivas, construiu-se um modelo preconceituoso de que ela representa o fim da vida social do indivíduo, podendo tornar a transição um momento de perdas e traumas. Dentro desta perspectiva pretendeu-se investigar como o Programa de Preparação para Aposentadoria pode impactar no processo de transição dos servidores de um órgão público de Administração Municipal.
As sociedades se organizam em função do trabalho, ele é o núcleo definidor da existência humana. Tendo em vista a centralidade do trabalho e a pretensão de uma carreira na construção do ser, a aposentadoria pode significar perda ou ruptura na identidade, com sentimentos de solidão e baixa autoestima.
 O ingresso no setor público é uma garantia de emprego até a aposentadoria, mas nem sempre proporciona a realização profissional que dá sentido ao colaborador para levantar-se todas as manhãs e entregar oito horas de sua vida a uma atividade, proporcionando, muitas vezes, apenas retorno financeiro para o seu sustento. Pressupõe-se, que pelo fato de o servidor normalmente permanecer em seu cargo até a aposentadoria e possivelmente não na carreira pretendida, o serviço público contribui para a inflexibilidade da vida profissional e dificulta a busca por novos rumos e expectativas na relação de trabalho, tendo em vista a segurança da estabilidade no setor.
A primeira definição de aposentadoria em termos formais é denominada como categoria inativa, o que significa não estar funcionando. Em contraponto com esse modelo, constata-se que a aposentadoria não é mais contemplada apenas por idosos, ao contrário, com o aumento da expectativa de vida, as pessoas estão se aposentando em uma idade produtiva e a experiência dessas pessoas pode ser ainda muito útil dentro das organizações. Expectativas de maior qualidade de vida, viagens e ganhos extras se mostram misturadas à insegurança econômica e de saúde, pressupondo-se que é o momento de repensar as perspectivas e avaliar sua trajetória, optando por um caminho a seguir.
Os Programas de Preparação para a Aposentadoria consistem em processos de ressocialização, permitindo aos participantes receber informações, reformular a rotina, criar expectativas, dividir anseios e crises de identidade. Eles têm o objetivo de facilitar e intermediar o processo, apresentando alternativas, oportunidades de novos projetos de vida e atingir o desenvolvimento pessoal e sentimento dos participantes. Objetivo Geral do PPA é estimular a consciência sobre a realidade da aposentadoria, enfocando as perdas e os ganhos.
 Nos últimos anos o PPA da PMPA tem propiciado a preparação de uma média de 115 aposentandos por ano. A vontade de se aposentar está voltada, principalmente, à vontade de usufruir mais tempo livre para realizar atividades prazerosas, sejam elas lúdicas ou laborais (continuar trabalhando em outro âmbito, projeto). É a hora de aflorar novos dons, realizar sonhos antigos ou despertar novos. A aposentadoria abre as portas para um mundo cheio de opções, que podem ser continuar trabalhando, no antigo ou em um novo emprego, criar um negócio próprio, se dedicar às artes, à saúde física, mental e/ou à família. É se permitir ver e respirar novos horizontes, fazer tudo aquilo que por um motivo ou outro, deixou-se de lado ao longo da vida.
Na visão dos entrevistados, o PPA conseguiu atingir seus objetivos impactando significativamente na tomada de decisão e esclarecendo as duvidas, proporcionando aprendizado, autoconhecimento, apoio, incentivo à reflexão e planejamento. As atividades consideradas mais importantes no programa foram os  aspectos psicológicos para enfrentar a aposentadoria, que preparam a mente para receber consciente e aceitar essa nova fase, e controle financeiro, que propõe entender às mudanças na remuneração e planejar seu orçamento para viver bem com ele. Os entrevistados expuseram seus planos de continuar ativos em novos horizontes ao mesmo tempo em que pretendem aproveitar um pouco mais a vida e o que ela tem a oferecer.
O ócio mostrou-se o menor dos desejos. Com planos pré-determinados ou ainda não pensados, a certeza é uma só: todos os entrevistados têm um grande desejo de viverem muitas coisas e viver muito, inclusive a maioria associa qualidade de vida a ter mais tempo livre para lazer, convívio familiar, social, viagens e tudo mais que estava cronometrado pelo relógio do trabalho. É pertinente citar nessa abordagem o caso de um entrevistado que criou sua lista das “100 coisas para fazer quando estiver aposentado” publicado em seu blog, criado justamente como ferramenta pessoal de auxílio ao enfrentamento do processo de aposentadoria, um ano antes de se desligar efetivamente. Blog este que continua existindo até hoje, dois anos depois, como uma de suas atividades rotineiras, inclusive possibilitando o nascimento de um livro com crônicas de suas memórias do trabalho.
É possível aproximar da teoria também o que ficou implícito nas entrevistas através do que não foi dito. Não houve relatos de qualquer transtorno efetivo no convívio familiar (apenas no âmbito social que já era esperado) ou em crises existenciais tanto no processo de preparação, quanto na aposentadoria em si. O PPA foi unanimemente bem referenciado pelos entrevistados, podendo ser considerado assim, um exemplo para outras empresas públicas e privadas a fim de explorar o tema de preparação para aposentadoria que está atingindo uma dimensão cada vez maior dentro das organizações e assumindo grande importância no processo de aposentadoria dos brasileiros.
-Valeu Gabriela Werlang, parabéns!

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