Acabaram de me
informar que o Hugo Chávez morreu. Vou iniciar minha conferência aqui em Porto
Alegre dizendo que: Hugo Chávez era um dos nossos! Assim falou Žižek,
o atual filósofo pop-star da esquerda mundial (uma espécie de novo Sartre), na
abertura de sua palestra com o sugestivo título: De Hegel à Marx e de volta à
Hegel.
Slavoj Žižek é um tipo esquisito,
como o seu próprio nome, com acento na letra z, é cheio de tiques gesticulares
e fala como uma metralhadora atirando pra tudo quanto é lado. Nascido na
capital da hoje Eslovênia (ex-país comunista do leste europeu), doutorou-se em
Filosofia e estudou Psicanálise na Universidade de Paris. Žižek é conhecido por
seu uso de Jacques Lacan numa nova leitura da cultura popular, e tópicos como o
leninismo, fundamentalismo e tolerância,
o politicamente correto e outros.
É sabido que Marx
era um seguidor filosófico de Hegel, e que derivou do mestre achando que o
filósofo tem que agir politicamente para transformar o mundo, e não apenas
buscar entendê-lo e explicá-lo. Deu no que deu, no violento sistema stalinista.
Žižek vivia
no olho do furacão comunista quando ele implodiu, mas ainda acredita na utopia
marxista, apenas recomendando que se retorne de Marx à Hegel, pra estudar o que
faltou no projeto leninista de
socialismo que acabou descambando para a violência.
Juremir
Machado, em várias colunas antigas sobre o chavismo e os agourentos da morte de
Chávez, destacou que mesmo sendo um recordista de ganhar eleições, o cara é
criticado e condenado como um ditador, especialmente por ter cometido o pecado
mortal de realizar uma reforma agrária, com distribuição de terras aos
camponeses, e ter reduzido a carga de trabalho de 44 para 36 horas semanais. Agora
o jornalista voltou à carga comparando a semelhança entre Venezuela com o Brasil,
onde para as elites qualquer política pública que privilegie os miseráveis é
rotulada de populista. Funcionou contra Getúlio e Jango, mas já não colou no
Lula. Populismo foi um conceito inventado pela direita como álibi para não se
tocar nos interesses dos ricos.
Chaves foi
além, realizou até o sonho de muitos dos seus críticos no Brasil: extinguiu o
senado e fixou em, no máximo, três os mandatos permitidos para deputados. Poucos governantes foram alvos de
campanhas de demolição tão odiosas como o ex-presidente da Venezuela, assim
como poucos foram tão idolatrados pela sua tribo, literalmente. Chávez, que
adorava instigar a ira imperialista dos ianques “donos do mundo”, fez jus à uma
emblemática manchete de um jornal norte-americano: Morreu um provocador!
Slavoj Žižek
reconhece que o sistema capitalista é universal, funciona bem com qualquer
religião ou regime político, como paradoxalmente até na China, país que está
demonstrando ser o comunismo o melhor administrador do novo capitalismo. O cara
afirma que não estamos vivendo uma crise global, que esta é uma crise
estritamente local e européia. Diz que a Europa está perdendo sua função de
modelo, o que não é um fenômeno para se comemorar, pois o que está surgindo em
lugar do capitalismo europeu é o asiático, um capitalismo mais autoritário.
O problema é
como mudar a vida real depois do êxtase revolucionário, quando tudo volta ao normal.
Conclui dizendo que não gosta desta idéia esquerdista de que precisamos de
democracia participativa, na qual estaremos todos engajados. A maioria de nós,
na qual se inclui, não quer participar o tempo todo de política, quer um Estado
eficiente que lhe permita viver em paz. Considera o Brasil um bom exemplo daquilo que, com uma política
inteligente, se pode fazer dentro das coordenadas do capitalismo global.
Pessoalmente,
enquanto um esquerdista humanista não marxista, já fui mais encantado com a democracia
direta, a partir da experiência do orçamento participativo portoalegrense e do
Fórum Social Mundial. Porém, tem bagulho bom aí! O principal fato político da
eleição municipal de 2012 foi o episódio surreal das cenas de violência
despropositada das forças de repressão contra os jovens que protestavam
mobilizados pelo movimento “Defesa Pública da Alegria” no entorno do boneco
inflável “Tatu Bola da Copa-Cola”, símbolo da copa do mundo de futebol. O protesto diante do mascote da discórdia
reunia músicos, artistas plásticos e de teatro, e ativistas políticos dos
grupos chamados de Coletivos Urbanos, como o Levante da Juventude, Bloco de
Laje, Cidade Baixa Livre, Catarse, Comitê Latino Americano, Punks do Coletivo
Galera do Bosque, Raiz Urbana e RUA (Rastros Urbanos de Amor).
Os movimentos
sociais, de tanto serem atropelados, como os ciclistas da Massa Crítica, estão
passando à frente dos partidos políticos e, PEDALANDO PELADOS, estão partindo pra fazer a democracia
direta com as próprias mãos em Coletivos Urbanos que se multiplicam em
metrópoles como São Paulo, Rio, Florianópolis e Porto
Alegre.
Contudo, nisso
eu discordo
do Žižek. Hoje , como dizia o
Gonzaguinha, “eu acredito é na rapaziada, que vai em frente e segura o rojão.
Eu levo fé é na fé da moçada” dos Coletivos Urbanos, que em vez de protestos
promovem intervenções criativas na cidade. Sem vinculações com partidos
políticos nem palavras de ordem surradas, estão formando as bases do ativismo
cidadão do século 21, articulados em redes tecnológicas e voluntariados em
estruturas anárquicas de democracia direta. Os Coletivos Urbanos equivalem ao
retornar de Marx à Hegel, ou seja, de fazermos no próprio movimento, aqui e
agora, a prática dialética do futuro idealizado.
É meu amigo Celso, eu também já fui deslumbrado com o socialismo, porém com o passar dos anos a cada dia mais tenho impressão de que necessitamos de um presidente com braço de ferro para condenar toda a corrupção que se alastra neste país... Talvez uma espécie de Hugo Chaves Brasileiro que invista mais em educação e que diminua a desigualdade social.
ResponderExcluirEnquanto isto não acontece vamos apoiando os movimentos sociais interessantes e tentando fazer com que os jovens vejam no mau exemplo dos nossos políticos um caminho que eles não devem seguir.
Celso, vejo nesses movimentos de manifestações fora da ortodoxia um certo retorno ao ativismo contracultural dos anos 60 e 70.
ResponderExcluirNa prática, não sei se funcionam. Os interesses políticos, midiáticos e econômicos são muito fortes e enraizados e este tipo de resposta pode soar, apenas, como uma demonstração de vigor juvenil com certo ar anarquista.
O capitalismo é muito esperto, quando não pode combater uma dissidência ele, capitalismo, a integra e passa a massificá-la, tirando todo o conteúdo revolucionário que aí havia.
Pode ser que esteja errado, mas não acredito que as estruturas do "estabilishment" se abalem...
Ricardo Mainieri