Sempre quando ouço os
lero-leros políticos-partidários, onde velhos e novos picaretas fazem apologias
românticas e ilusionistas da democracia, me lembro dos meus estudos do filósofo
Nietzsche, o destruidor de ídolos.
A elaborada teoria
nietzschiana da genealogia da moral, resumindo, diz que a modernidade
ocidental-cristã derrubou as virtudes pagãs da cultura grega e instituiu uma
moral de escravos. É nesta perspectiva que os movimentos de jovens, tanto o estudantil
quanto o hippie, se rebelaram contra a moral repressora na década de 60, e por
isso são tidos como nietzschianos. O filósofo bigodudo gostava de associar ao
deus Apolo ( deus da beleza, perfeição, harmonia, equilíbrio e razão) as
pessoas que se têm por politicamente certinhas; e ao deus Dionísio (das festas,
do vinho, da exacerbação dos sentidos e excessos) os malucos psicodélicos que
se jogam na vida de ponta cabeça.
Agora, com a avalanche
de condenações de jovens que protestavam mascarados em várias capitais do país,
enquadrados pela nova lei do Crime Organizado ou pela velha lei de Segurança
Nacional; e com a Ordem de Prisão dos condenados
no Mensalão, que está colocando na cadeia nossos apolíneos figurões do panteão
da esquerda revolucionária, parei para refletir para compreender melhor a minha
própria trajetória de vida: Meus heróis morreram de overdose e os meus líderes
estão no poder e na prisão!...
Na década de 60, eu
estava no lado dionisíaco da história, com uma pequena mochila nas costas,
pegava a estrada pedindo caronas e fazendo artesanatos para sobreviver. Vivenciei
comunidades hippies e festivais de música, drogas e rock and roll até no
Uruguai, paraíso das drogas livres na época; enquanto a juventude apolínea
fazia as barricadas nas ruas de Paris.
Na década de 70, alienadamente curtia o
tropicalismo com “Alegria,Alegria”, dionisiacamente caminhando contra o vento
sem lenço e sem documento; enquanto apolineamente a juventude engajada se
lançava na luta armada da guerrilha urbana contra a ditadura militar.
Na virada de 2000, virada
de século e de milênio, voltei a procurar a minha essência dionisíaca, mas o
máximo que consegui foi tornar-me um rebelde sem causa: voto nulo! Recorri,
então, ao estudo da apolínea filosofia clássica, tribo em que sempre me senti
como um estranho no ninho do meio acadêmico apolíneo. Passei a correr, como
Proust “Em busca do tempo perdido”, atrás das minhas vinculações dionisíacas
com a arte, especialmente com a literatura e a poesia, que se mantiveram minhas
fiéis escudeiras contra “a cultura de
rebanho” de apenas sobreviver, que é feito um caracol que se enterra em seu
próprio casco”, como esbravejava Nietzsche.
E sair singrando
Pela vida
Sem horários
Sem destino
No caminho imenso
Do tempo
Que me restar...
Vou finalmente
Caminhar contra o vento
Com lenço
E com documento
Nos bolsos e nas mãos
Pra mostrar
Que ainda sou eu
Que estou a caminhar
Que eu ainda
Estou caminhando
Contra o vento
E com documento
Pra provar.
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