A RODA DE CHIMARRÃO DA MANUTENÇÃO

A roda de chimarrão é uma das tradições nativistas que mais caracterizam o espírito de confraternização e proseador dos gaúchos. Desde o patrão à peonada de estância, desde os diretores aos operários do Dmae, todos se irmanam passando de mão em mão o mate amargo. A expressão “roda de chimarrão” vem da gauchada em torno do fogo de chão, mas prevaleceu no sentido figurado da cuia que roda de mão em mão respeitando sempre a mesma seqüência.
 Eu que já tomei chimarrão em antigas rodas formadas por gente que já se aposentou há muito tempo atrás, por último participava de rodas formadas pelos filhos desse pessoal, tais como o Marco Bica e o Lazzarin, filhos do Fernando Manjerona e do Sady Raposão. Naturalmente que a roda vai se renovando em novas gerações de funcionários da manutenção, e volta e meia retorno lá para matear com: Fernando, Oliveira, Erasmo, Ioni, Arraché, Ciro, Pedro,  e os novos servidores que vão se achegando na roda através de concursos públicos...
A rotina operacional das equipes de manutenção é a mesma desde sempre, ou seja, as turmas saem de manhã cedo para executarem serviços nas estações de bombeamento e tratamento do DMAE, e começam a retornar para a DVM depois das onze horas para o almoço e bicar um mate. Assemelha-se à rotina dos gaudérios que saiam a cavalo para as lidas do campo e voltavam para matear no galpão à espera da boia. Assim, tradicionalmente o pessoal que trabalha internamente, especialmente as chefias que distribuem os serviços para equipes de rua, preparam o chimarrão depois das onze horas e, na medida que as equipes vão retornando, novos mateadores vão se agregando à roda. Enquanto os capatazes fazem o relato dos serviços executados e das  eventuais pendências da manhã, o chimarrão vai lavando as tripas para esperar o rango da peonada.
 Como em toda a roda de chimarrão sempre são contados causos, segue alguns causos da Roda de Chimarrão da Manutenção que são contados mais ou menos assim:
INFIDELIDADE PÓSTUMA
Após a ocorrência do caso do acidente de trabalho fatal do jovem eletricista Ubirajara Teixeira, o Bira,  relatado aqui na postagem OS MORTOS DA DVM, conforme conta o folclore interno da rádio-peão,  quando entregaram para a viúva os objetos pessoais que o falecido tinha no armário do vestiário da Manutenção, deu problemas  póstumos de infidelidade, pois no armário havia cartas de casos extra-conjugais...
CACHORRO COM SETE VIDAS
O  Ori, vulgo “Cachorro”, foi assaltado há vários anos atrás e, ao reagir, levou um tiro no abdomem a queima-roupa. Esteve literalmente com o pé-na-cova, pois os ladrões que roubaram o fusquinha dele, na fuga  passaram com o carro por cima da sua perna. Mas, que nem gato, o Cachorro se reabilitou e voltou a trabalhar. Há poucos anos atrás gastou mais uma de suas muitas vidas, desta vez num acidente de trabalho. Ocorreu que uma marreta de ferro de 5kg  caiu de uns sete metros de altura sobre sua cabeça, numa estação de bombeamento de esgoto do DMAE.  Por sorte, pois ele conta que nem viu o perigo e estava sem capacete, a marreta pegou de  “raspão” no supercílio, provocando um corte superficial e meia dúzia de pontos no HPS. Se pega de cheio, estraçalhava a cabeça do Ori e acabava com todas as vidas que ele por ventura possa ainda dispor, era game-over! Porém, com mais sorte que juízo, segue o jogo das Sete Vidas do Cachorro que não que saber de se aposentar...

O FAZENDEIRO DO MEL
O Meleiro Hugo (o Pilha Fraca), estava  pensando em se aposentar junto comigo, e já tinha o seu projeto do que fazer após a aposentadoria: se dedicar ao apiário, atividade que normalmente já lhe proporcionava duas colheitas ao ano de 600 kg de mel, nas florações de outono e primavera. Às vezes, quando a floração é muito boa, “dá sobre-caixas” (que é uma terceira colheita no verão). Para acessar os sítios desabitados onde o Hugo tem suas caixas de abelha, ele costuma ir armado de espingarda 12, e conta que fica com a arma engatilhada enquanto a mulher abre os portões e portas das instalações prediais, tendo em vista que as casas seguidamente são invadidas por vadios da região. O Hugo dizia  que estando aposentado vai cuidar melhor e dar manutenção às estruturas das colmeias que ficam distribuídas num raio de 5 km. Na época ele já tinha encomendado 15 mil mudas de eucaliptos para plantar nos sítios dos seus abelheiros, para aumentar a produtividade. Já estava também estabelecendo entrepostos de distribuição da sua produção de mel nas diversas divisões do DMAE, treinando colegas para servirem de intermediários mediante recebimento de comissões nas vendas. E ainda assim, com toda esta programação de atividades dele para após aposentadoria, ele me revelou que estava sentindo um “medinho” por estar se aproximando a data da aposentadoria, ao mesmo tempo que me interrogava  se não ocorria o mesmo comigo...
-Normal, respondi, é um salto no escuro sem volta! Dá um frio na barriga, dá medo....Hoje, aposentado, o meleiro Hugo me conta que anda viajando tudo o  quanto pode por este Brasil imenso; o Pilha Fraca recarregou as pilhas e está voando mais que as suas abelhas!
O SORTEIO DA TELEVISÃO
            O Romeu (o Buldogue) compunha comigo (o Grazziotin) mais o Hélio (o Azeitona) e o Ranyr (o Grilo) os “Quatro Cavaleiros do Pátio”, técnicos industriais que chefiávamos as seções da manutenção na década de oitenta (Veículos, Preventiva, Mecânica e Elétrica, respectivamente). Trabalhamos na mesma sala por mais de uma década em perfeita harmonia, eles foram meus mestres e ajudaram a formatar o órfão de pai que eu era na pessoa humanizada que me tornei. O Romeu, com toda a sua aplicação e excelência profissional, apesar de ter cara de sisudo, era um baita gozador, adorava empulhar aos desavisados. Certa época tinha um estagiário de engenharia mecânica, um guri de origem italiana do tipo que busca levar vantagem em tudo, o Moretti, que no fundo era um baita de um ingênuo e filhinho de mamãe. Acontece que no refeitório da Manutenção havia uma televisão que já estava velha e dando defeitos. Como era da cultura da Divisão, foi feita uma “vaquinha” de contribuições entre os funcionários e foi adquirido um novo aparelho. Ao ver chegar a caixa com a nova televisão, em pleno mês de dezembro, o Moretti quis saber para quem era o receptor. Com a rapidez e perspicácia que era própria do Romeu, ele inventou que a TV era para ser sorteada na festa de natal da DVM. Logo entrou todo mundo na onda, alimentando a expectativa do estagiário “olho grande”. Não deu outra, no churrasco natalino em que tradicionalmente, como locutor ao estilo Sílvio Santos era eu que promovia os sorteios dos prêmios. Cabe registrar que os comes e bebes da festa e os prêmios eram adquiridos com o fundo recolhido durante o ano inteiro de cada participante, cobrado mensalmente pelo falecido Alonço, o Camundongo.
         A propósito de apelidos, tem os vulgos oficiais, que são ditos diretamente para o dito cujo; mas têm aqueles que são apenas sugeridos ou falados pelas costas.  O Camundongo era chamado diretamente de Miau (sugerindo o Camundongo), e o Buldogue  era referido sorrateiramente por medo que o Romeu, com suas bochechas de buldogue, ficasse brabo e mordesse. Mas era só cara de brabo, o Romeu Flávio Danilo Garcia (nome múltiplo como o próprio cara, mas não necessariamente nesta ordem) era um amigão e um gênio em mecânica, mente brilhante que tristemente a doença de Parkinson fez ele se aposentar muito, muito, muito precocemente!   Então, voltando ao sorteio natalino, o último e mais importante presente sorteado na noite foi a dita televisão e o felizardo ganhador, é claro, foi o estagiário Moretti. Que felicidade de criança dele ao receber o presente que tanto almejava!...Não lembro se deixamos ele levar para casa e descobrir sozinho que dentro da caixa estava a velha e sucateada TV valvulada, ou se o poupamos desse vexame familiar com a sua mamãe...
- Valeu Romeu, Hélio e Ranyr pelos muitos mates e causos exemplares!

Um comentário:

  1. DIA DO SERVIDOR 2013 - HOMENAGEADA 45 ANOS Diretoria de Operações - Gerência de Manutenção Industrial: CATARINA MARIA REINA CANOVAS.

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