O tema em
questão aqui se refere à Lei Complementar nº 133, capítulo que trata “Das vantagens ao funcionário estudante”
em seu artigo 90 que apresenta a seguinte redação: É assegurado o afastamento do
funcionário efetivo, sem prejuízo de sua
retribuição pecuniária, nos seguintes casos:
III
– para assistir aulas obrigatórias, em número de horas de até um terço do
regime semanal de trabalho prestado pelo funcionário, em curso:
§1º - A
existência, no Município de Porto Alegre, de curso equivalente em horário
diverso do de trabalho, exclui o direito do funcionário à vantagem prevista no
inciso III, deste artigo.
Em 2010,
quando me tornei pela quinta vez “Bixo da UFRGS”, eu já estava sendo ameaçado
de jubilamento (pé na bunda!) do curso de Filosofia, o qual eu já estava
freqüentando há sete anos (de 2003 até 2009). Em quase o dobro do tempo
previsto para um aluno fazer todo o curso, eu havia feito apenas 40% do
currículo, ou seja, menos da metade. Mas em compensação, eu já estava
convencido de que já havia adquirido a
minha formação filosófica básica, posto que nunca tinha pretendido ser
diplomado como filósofo: era abstração demais para a minha cabeça! Cursei as disciplinas obrigatórias de
História da Filosofia (grega, medieval, moderna e contemporânea), Metafísica,
Ética, Estética e Análise e Redação de Textos Filosóficos. Como se não
bastasse, cursei também as disciplinas eletivas de Sociologia Clássica,
Psicologia Geral e Astronomia. Ao todo, completei 15 disciplinas totalizando 84
créditos com aprovação, o que significa cerca de 1.500 horas/aula assistidas.
O uso deste
benefício do direito estatutário de estudante, além de ampliar os meus
horizontes culturais enquanto pessoa, me aliviou em cerca de 187 dias úteis
(praticamente um ano inteiro computados finais de semana e feriados) da carga
horária a ser cumprida dentro dos muros monótonos do serviço burocrático da
repartição pública. Parece muito tempo, até eu me assombrei quando realizei
estes cálculos. Mas se eu tivesse utilizado o limite máximo permitido de 1/3 da
carga horária semanal previsto na legislação, em sete anos eu poderia ter
passado o equivalente a 2,5 anos inteiros
assistindo aulas interessantes na universidade; mas preferi fazer apenas uma
disciplina por semestre para poder me dedicar com profundidade a cada uma
delas. Estava de ótimo tamanho, pois esta é uma lacuna da minha vida que foi
preenchida espetacularmente: Valeu DMAE!
Mas esta
questão do direito de sair para assistir aula no horário de expediente de
trabalho nem sempre foi ou é uma questão pacífica, geralmente há fortes
controvérsias de interpretações jurídicas a cada nova administração que se
instala na cúpula de poder do Departamento. Cabe esclarecer, de antemão, que desde
de sempre só era autorizado assistir aulas no horário de expediente em
disciplinas que não fossem oferecidas, comprovadamente, pela própria UFRGS em
outros horários.
Porém, em maio
de 2007, de repente foi “indeferido” o meu já tradicional pedido de redução de
carga horária para assistir aulas em horário do expediente, contrariando os
“deferimentos” feitos em todos os semestres anteriores. Foi indeferido com base
num novo parecer da COJ (Coordenação Jurídica do DMAE), contra o qual tive que enfrentar
uma briga ferrenha através de
contestações, réplicas e tréplicas; recursos em todas as instâncias, peleja que
se alastrou até o Gabinete do Prefeito.
Primeiro inutilmente enviei uma
contestação argumentativa, citando o conceito de “equidade” de Aristóteles para
combater as “citações de juristas” e os “data-vênias” do parecer da COJ. No
recurso argumentei que a leitura burocraticamente legalista da COJ não exerce a
virtude da “eqüidade”, e que está norteada por um princípio equivocado, qual
seja, que o “servidor possa optar por
um curso pretendido em horário diverso do de trabalho”, pois não se pode
considerar como uma opção real
aquilo que é inacessível financeiramente à realização objetiva por parte do
servidor. Não consta que sejam opções “equivalentes” uma faculdade pública e
gratuita e uma faculdade particular de custo financeiro proibitivo. Adequar-se
à lei, nos termos interpretativos da COJ, seria a trágica opção shakespeareana
entre o “ser ou não ser” mais estudante.
Visando evitar
que esta nova interpretação legalista adotada liquidasse com o espírito da lei
133/85 de propiciar que os servidores estudem, tornando-a assim letra morta; recorri à consideração do Diretor
Geral do DMAE, uma vez que estava se tratando naquele processo de uma questão de interesse coletivo
dos servidores, por se tratar de um direito estatutário consagrado. Quando
esgotada esta via pela negativa do DG, propus que o expediente fosse enviado
para a procuradoria do município, mas a petição foi considerada literalmente
“sem relevância” para demandar tais encaminhamentos.
Todavia, por
considerar que o tema do “direito dos estudantes servidores municipais alunos
da UFRGS” tem significativa relevância de mérito, recorri ao último recurso,
que é a instância da autoridade máxima no âmbito da Prefeitura. Recorri ao
Prefeito, com o intuito de que seja manifestada uma interpretação oficial que
sirva como jurisprudência unificadora dos pareceres no âmbito de toda a PMPA,
relativamente ao tema objeto da petição, sobre a redução de carga horária para
assistir aulas oferecidas exclusivamente em horário do expediente de trabalho
dos servidores, nos cursos diurnos da UFRGS.
Assim, o
processo do pedido de redução de carga horária que protocolei inicialmente em
abril de 2007, referente ao primeiro semestre, teve seu desfecho só no final de
setembro, já em meados do segundo semestre (período em que eu continuei cursando
normalmente em horário de expediente por minha conta e risco), com o Parecer
66/07 da Assessoria Jurídica do Gabinete do Prefeito, com o seguinte teor
contundente:
Esta ASSEJUR/GP considera ter o servidor
direito a esse benefício. Trata-se de utopia admitir nos dias de hoje, que seja
possível a comparação entre uma faculdade privada e a UFRGS, sendo que a
primeira exige pagamento de custos altíssimos, inversamente a segunda que é
gratuita. Bem como não se pode admitir que esteja privado de freqüentar a
instituição por ser o artigo restritivo, tendo em vista que um curso na esfera
privada não é equivalente, porque à luz da interpretação restrita teria de ser
analisado exatamente o significado desta palavra, a qual segundo o dicionário
significa dizer: “de igual valor; aquilo que equivale...”.
Por óbvio não é o caso, a UFRGS não equivale
a nenhuma outra faculdade de Porto Alegre em termos econômicos, visto a
gratuidade do ensino.
Face ao exposto, esta ASSEJURIGP recomenda a
V. Exa seja conhecido e deferido o presente recurso, em face dos fundamentos
acima descritos.
É o parecer.
E a COJ, muito a contragosto, ainda resmungando que
considerava que o parecer do GP estava confrontando com o disposto na lei, teve
que elaborar novo parecer sugerindo o deferimento da redução de carga horária
por mim solicitada seis meses antes.
Desde então foi sempre assim a cada novo semestre, faziam o deferimento por força
do parecer superior, mas continuavam registrando a contrariedade por escrito pelo
sapo engolido.
Foi assim que,
como Bixo 2010, antecipei o meu jubilamento em Filosofia. Ao fazer a opção pelo
Curso de Letras no ato da matrícula, iniciei o preenchimento de uma outra
lacuna na minha formação pessoal, que é o domínio das “Letras”, das quais estou
obeso, pois delas sempre me alimentei como um amador guloso, sem nunca ter me
submetido às dietas acadêmicas. Curso que continuo fazendo agora como
aposentado, no mesmo ritmo do tempo da ativa e igualmente sem pretender diplomação nenhuma.
E foi assim
que este ativista solitário da causa sindical, que em outras épocas já foi um militante
agitador de massas, conseguiu no tapetão
garantir a manutenção do direito dos estudantes dos cursos diurnos da UFRGS para
todos no DMAE, modéstia à parte!
Não podemos se entragar pros homens, de jeito nenhum, amigo e companheiro. Eu tive um problema idêntico só que eu queria a redução da carga horária ou seja a dispensa do regime. Foi uma luta ferrenha que depois de muita ameaças consegui no peito e na raça. Essa é a vida!De luta em luta vamos em frente, talvez essa seja a sina do gaúcho. Forjado a ferro e fogo.
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