O Álvaro, o meu colega de “cela”, e o Rogério, o meu atual Diretor, chegaram empolgados com a palestra empresarial de neurolinguística motivacional do tipo “auto-ajuda” promovido pelo Escritório de Qualidade, prática que agora busca promover o trabalho ao status de “sentido da vida” das pessoas modernas, já que a vida perdeu o seu sentido transcendental na sociedade contemporânea e este lugar está vago.
Após também a ciência perder o seu status de potencial candidata a ser o sentido da vida, por não ter conseguido propiciar a construção de uma sociedade justa e fraterna, a tendência gerencial pós-moderna é de fazer do trabalho uma espécie de religião. Com a globalização, as antigas motivações de vantagens salariais e sociais são coisas do século passado, e como só resta a perspectiva de perdas e desempregos, os mega-empresários multinacionais (aqueles que no budismo se diz que vivem no mundo dos deuses, que têm tudo para serem felizes, como o mexicano Carlo Slim, dono do trio Claro-Net-Embratel, que é tido como o homem mais rico do mundo) estão querendo canalizar para o trabalho toda a energia devocional com que os crentes se dedicam voluntariamente aos seus cultos, com custo zero. Neste sentido, os grandes executivos/políticos (que no budismo se diz que vivem no mundo dos semi-deuses, seres que vivem guerreando entre si e com os deuses – Guerra de Titãs - para aumentar cada vez mais a sua própria riqueza, querendo também ele vir a ser mais um do mundo dos deuses) estão catequizando as massas de assalariados com estas palestras motivacionais através da seita dos Programas de Qualidades, como o PGQP do Sr. Gerdau no território gaúcho.
A propósito de religião, com a sua sabedoria peculiar o Dalai-lama diz que “os cientistas são crentes e os budistas são céticos”, e não o contrário, como se poderia imaginar. A ciência é crente em suas teorias e hipóteses, já os budistas são ateus.
O Lama budista Padma Samten, ex-professor de Física quântica da UFRGS, comenta na Revista Bodsatva de março/2010 que está participando de grupos de estudos multidisciplinares, promovido por corporações empresariais globalizadas, grupos estes que reúnem com cientistas toda a gama de religiosos, desde o judeu ao espiritismo e ao candomblé. Referencia o Lama que no ano passado 86 bancos (de propriedade dos deuses) quebraram nos EUA nas mãos dos executivos (semi-deuses) que não perceberam a bolha que se formou e os engoliu. Deuses, semideuses e humanos (trabalhadores assalariados e autônomos) entendem agora, avalia o Lama, que precisam formar uma aliança para estabilizar a biosfera com sustentabilidade e pacificar as pessoas através da harmonia.
Os deuses e semideuses precisam repensar este modelo de civilização motivada pelo consumismo desenfreado de “supérfluos” tecnológicos que, além de terem alto custo de danos ao meio ambiente em sua produção, rapidamente ficam obsoletos e se transformam em lixos não degradáveis e altamente poluentes. O paradoxo fatal é que se houvesse uma inclusão social mundial das populações que hoje vivem em condições sub-humanas, inclusão em que todos os seres humanos tivessem um padrão classe média de consumo europeu ou americano (que é a felicidade que todos almejam), precisaríamos de dois ou mais planetas para sustentar tais demandas; logo neste modelo vigente o bem estar de alguns precisa da miséria degradante de muitos.
Todavia, as mudanças de perspectivas dos donos do mundo e seus executivos/políticos ainda não são suficientes para que eles possam assumir tratados internacionais com metas de redução do efeito estufa, do buraco de ozônio e da fome & sede no planeta; ainda não se convenceram que este modelo de progresso civilizatório que produz como se a matéria prima da natureza fosse inesgotável é ecologicamente insustentável. Mas já estão discutindo estas possibilidades e estão buscando incorporar a metodologia da pregação teológica sobre o pessoal que vende sua mão de obra, visando neutralizar a surrada dialética ideológica da mais valia do senhor-escravo e patrão-empregado e, é claro, sempre visando aumentar a produtividade e o lucro e diminuir o custo.
Assim, vendo a empolgação dos meus colegas com estas palestras motivacionais de promover o trabalho para ser o sentido da vida de cada trabalhador, me sinto triplamente cético sobre a mistificação do trabalho nesta Guerra de Titãs: por eu ser ateu, ser anarquista e ser um aposentando!...
Achei este texto de uma clareza inovadora,(para mim) o fato de os bancos quebrarem e um budista indicar para os engolidos pela bolha, uma aliança para estabilizar a biosfera com sustentabilidade e pacificar as pessoas pela harmonia - e referencias a economia sociologia e teologia levam a crer que V.Sa. não é ateu, menos ainda, anarquista, trabalha muito com sua produção de conteúdos inteligentes. Mas o que será que pode inverter a condição de que o bem estar de alguns dependa da miséria de muitos?
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