Parece que a
surdez crônica dos políticos ainda não foi vencida com a gritaria do povo
durante o inesquecível mês de junho/2013, em que o Brasil tremeu inteirinho,
como nunca antes na história deste país. Cadê a reforma política que as vozes
das ruas exigiam? Constituinte? Plebiscito? Referendo? Pra quando?!...A
embromação continua, apesar de todo o revolucionário quebra-quebra dos palácios
e parlamentos que não nos representam mais!
Com toda esta
fantástica mobilização nacional provocada pelo monstro da força popular que
acordou pelas ruas do país, faço esforço para
ressuscitar o urso que está adormecido em mim, feito um CAPACHO VELHO, e que só quer fazer
poemas:
Como um peludo tapete branco
De pele de urso com
cabeça
Estendido sob os pés do poder perverso
Imobilizado, não consigo puxar-lhes o tapete
Nem um abraço de urso, nem um urro forte
Nada mais tenho para os ameaçar
Sou mais um velho capacho, sem esperança
De fazer ou ver o mundo melhorar...
Estávamos todos sem esperança de
ver o Brasil melhorar: Estávamos! Agora, vendo a gurizada atropelar revolucionariamente os
palácios governamentais e os parlamentos dos “trocentos picaretas” reunidos em
partidos para se locupletarem, fazendo eles desengavetarem às pressas projetos
que há anos sentam em cima, o urso hibernado em nós deu sinal de vida,
despertado pelos nossos filhos.
Fazendo um
gancho com esta metáfora do “urso hibernado”, além do idealismo juvenil de se
querer melhorar o mundo, o quanto mais de nós fica hibernado na maturidade? O
quanto de nós hiberna para sempre soterrado na neve do esquecimento, e o quanto
destes ursos soterrados em nós conseguimos despertar na velhice?...Volta e meia
este poema Capacho Velho, de 2010, me volta à mente agora que me vejo atrapalhado
para dar conta do meu tempo livremente.
Eu sempre tive vida dupla, uma que eu buscava uma formação escolar e
profissional, para poder me auto-sustentar, e a outra que deixava dentro do
armário em casa, para soltar apenas nos finais de semana, que era a de viver o
mundo da literatura: ler e escrever. Hoje esta minha outra vida não está mais
fechada no armário, como neste exato momento em que estou escrevendo esta
postagem para o meu blog-livro-diário-memorialista em pleno horário de
expediente: o urso não está mais hibernado, o monstro acordou!
Finalmente chegou o esperado
momento de abrir o armário e soltar a criatividade poética e aprisionar o engenheiro em casa como
um aposentado. A minha vida dupla, com distribuição desproporcional do tempo
entre elas, ainda de certa forma permanece, pois eu nunca parei de ser
formalmente aluno universitário, de maneira que continuo ocupado na minha
formação intelectual, lacuna insaciável, mas agora já com algum tempo para os
meus voos ficcionais. Tanto que até já conquistei o meu primeiro prêmio
literário:
No final de 2011, recebi um email
institucional da UFRGS comunicando que eu havia sido premiado com o meu conto
“Por um fio de cabelo” no Concurso de Contos Caio Fernando Abreu, promovido
pelos Institutos de Letras e de Artes,
em conjunto com a Associação Gaúcha de Escritores (AGES). Na noite da
premiação, feito num baile de conto de fadas, eu penetrei fundo pelos
imponderáveis ambientes de castelos medievais do Palácio Piratini, pelos pátios
com vistas para a Catedral e para o Guaíba, até acessar ao mitológico Galpão
Crioulo do Palácio, local tradicional dos festejos dos detentores do poder de
cada momento histórico gaúcho. Então, feito a Gata Borralheira, de repente eu
estava inserido de igual para igual com os grandes escritores gaúchos que são
ou foram membros da diretoria da AGES. Na mesa principal, como cicerones, o
Governador e escritor Tarso Genro e o Secretário de Cultura e escritor Luiz de
Assis Brasil e, entre os atuais diretores da entidade, a professora Jane
Tutikian, patrona da Feira do Livro 2011, que fizeram seus discursos enquanto
jantávamos peixe assado no espeto com espumantes e vinhos da safra gaúcha. O
microfone ficou liberado ao público e
nomes dos fundadores e destacados escritores e poetas sócios da AGES foram lembrados e homenageados, tais como
Celso Pedro Luft, Ivette Brandalise, Ivo Bender, Kenny Braga, Laci Osório, Luiz
Antônio de Assis Brasil, Luiz Coronel, Luiz de Miranda (primeiro presidente da
Associação), Luiz Pilla Vares, Lya Luft, Mário Quintana, Moacyr Scliar e outros
tantos, alguns presentes e outros já falecidos.
Recebi o meu
diploma de Menção Honrosa das mãos da presidenta da AGES, Maria Eunice, e os
cumprimentos do Luiz de Assis Brasil e do governador Tarso Genro na mesa do
cerimonial. Mas antes que a minha carruagem voltasse a se transformar na
abóbora real da minha rotina de cronista blogueiro (e de mero aspirante ao
status de escritor com livro publicado), saí correndo pelas escadarias do Palácio
Piratini como um urso desperto.
Parabéns colega,
ResponderExcluirCurso em prosa, fluxo lírico, deságue poético...
Uma travessia lúcida, bonita, e esperançosa
Esse fingido urso hibernado
que não se entrega ao predador
Sabe, sábio, a hora de despertar.
Abração