A Madrinha e o Último Dia de Cada Dia


            Ontem almoçamos na galeteria  Bella Mamma em comemoração do aniversário da Engenheira Catariana, minha ex-colega da “sala dos dinossauros da manutenção”. Como os três ministros do STF que foram sendo defenestrados durante o julgamento do Mensalão, ela também  completou a cabalística idade em que se entra no limiar da  porta de saída pela aposentadoria compulsória dos funcionários públicos que completarem 70 anos...É intrigante e sempre me pergunto por que os legisladores, que tudo podem, ainda não revogaram esta lei do compulsório “pé na bunda” se é um tiro no pé deles mesmos?...
Em outubro de 2010 eu postei aqui um texto denominado “A Madrinha da DVM”, postagem que suscitou muitos comentários apoiando a merecida homenagem à Catarina. Contava que, em termos organizacionais, houve três momentos distintos marcantes a serem destacados nesta longa história desde a EME, antiga sigla da Manutenção (Engenharia-Manut.), até o final do meu tempo na DVM, e agora com a reestruturação a GEMAN (que vem a ser o quarto momento histórico, a nova era após a extinção dos Dinossauros). O primeiro grande momento foi já na fundação estrutural e operacional, com a visão progressista de gestor público do mentor da Divisão, o Engº Lourenço Melchiona (O “Cacique”), implantando um organograma funcional dividido entre equipes de Manutenção Corretivas e Preventivas.
 Já neste período de implantação e consolidação do serviço de manutenção de equipamentos operacionais do Dmae, na década de 60, se destacou  o trabalho de uma jovem engenheira elétrica. Pioneira, enquanto mulher numa área até então exclusivamente masculina, a Engª Catarina se destacou por ser literalmente muito elétrica em suas atividades (como é até hoje), e também por sua simpatia e empatia com o pessoal das turmas das oficinas e das equipes de rua, tanto que passou a ser tratada carinhosamente por todos como “A Madrinha”.
 O segundo grande momento foi na década de 80 em que, com o boom da informatização, todos os procedimentos que já se praticavam manualmente foram repassados para o sistema MAN. A  Madrinha foi a grande condutora do enorme “trabalho formiguinha” que se fez necessário para digitar todas as características técnicas dos mais de cinco mil equipamentos na nova ferramenta gerencial que passou a ser o tal de computador.
O terceiro grande momento da DVM foi na década de 90, quando se visou modernizar o programa que estava operando numa plataforma tornada obsoleta. O colega técnico industrial (engenheiro e micreiro nas horas vagas), Eduardo Mattos, foi desenvolvendo o sistema SIGES, como uma réplica das funções do antigo MAN,  mas em linguagens atualizadas para a moderna plataforma operacional do Windows e com novos recursos. Também nesta transição a atuação da Madrinha da DVM foi fundamental, com seu grande cabedal de conhecimentos técnicos, pessoa tão dedicada ao trabalho que chega saber de cabeça a marca e potência da maioria dos equipamentos espalhados pelas estações do Dmae, cuidando de cada um deles como se fossem seus bichinhos de estimação.
Na última década a Madrinha da DVM assumiu  o gerenciamento de todas as contas com energia elétrica do DMAE, que se  constitui num dos maiores gastos financeiros do Departamento. Este monitoramento do consumo de energia elétrica em cada unidade operacional ou administrativo do DMAE, resultou num trabalho de eficientização energética reconhecido por propiciar reduções significativas de custos e que  tem servido de modelo para os outros  órgãos da Prefeitura.
 Eu trabalhei com a Madrinha desde 1978, praticamente por cerca de trinta anos, descontado um breve período que me afastei da DVM. Quando eu ainda era estudante de engenharia, era ela quem fazia as traduções, do inglês para o português, dos meus polígrafos  técnicos sobre mineralogia. Nos meus últimos doze anos de atividade  trabalhamos direto na mesma sala e chegamos a dividir por alguns anos o mesmo computador. Talvez a nossa melhor obra conjunta, tocada a quatro mãos, tenha sido a elaboração de vários volumes de Instruções de Manutenções Preventivas para os novos equipamentos adquiridos pelo DMAE.
Um alerta importante, que pode ser útil para outros colegas aposentaNdos nesta mesma situação, é que se até a data do aniversário de 70 anos não tiver sido publicada a portaria da aposentadoria, o servidor é aposentado compulsoriamente, perdendo as vantagens de “integralidade e paridade”! Como o tempo de demora entre o pedido e o ato de aposentadoria pode demorar até   seis meses, significa que até meados de junho de 2012 a Catarina deve protocolar no Previmpa o seu processo de despedida do Dmae, depois  de 44 anos de inestimáveis serviços prestados ao Departamento e à comunidade portoalegrense.
A partir de  agora a Engenheira Catarina é definitivamente uma aposentaNda. Ser um aposentando significa viver cada dia no trabalho como sendo o último dia com aquele número de cada mês vivido no ambiente profissional. Rompem-se os monótonos elos desta longa corrente de dias, semanas e meses, que parecem ser infinitamente contínuos e que sedimentam como sendo o tempo de serviço computados na ficha funcional de cada um. Cada dia passa a existir como um elo diferenciado, por ser o derradeiro de sua espécie que é definida pelo número do dia e pelo nome de cada mês.
Ser um aposentaNdo no último ano é viver cada dia como se fosse o último, é andar prestando atenção em cada detalhe da mesma trajetória tantas vezes repetida distraidamente. É bom prestar atenção enquanto se está na ativa, fazer um luto prévio, pra não sermos contagiados pelo saudosismo melancólico depois, quando já não estivermos mais revivendo esta rotina. Estou convencido que o propagado tédio associado à vida de aposentado é uma invenção do sistema capitalista, feita para amedrontar e assim poder explorar por mais alguns anos os trabalhadores.
No próximo aniversário a Catarina com certeza estará fora do Dmae. Portanto, amanhã será o último dia 20 de dezembro em que ela se submeterá ao relógio ponto, este será o último natal...todos os dias de um aposentaNdo passam a ser o último dia de cada dia na ativa...AposentaNdos, aproveitem cada dia como uma compartilhada despedida alegre com os colegas e prepararem uma saída sem luto para um novo e definitivo desafio: viver livremente do relógio ponto!
Para encerrar esta homenagem, peço que fiquem com a certeza da minha admiração e carinho por tudo o que a Engenheira Catarina representa na vida de todos nós, membros das várias gerações da grande família que compõem a história da DVM (da EME à GEMAN); e peço que compartilhem os meus agradecimentos por tudo, inclusive as frutinhas (maçãs e peras) que ela trazia de casa e repartia igualmente, entre os seus afilhados mais próximos, todas as manhãs pontualmente às 9:30hs...

- Valeu muito Catarina Reina Cánovas, com sua benção Madrinha!








Um comentário:

  1. Parabéns pelo texto, Celso. Ficou muito legal e a madrinha também gostou muito da homenagem. Ela já chegou comentando com todos aqui na sala sobre o texto.

    Abraço

    Thiago

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