Os Quatro Dinossauros da Manutenção


         Ontem voltei a almoçar na churrascaria Grelhatus com os meus ex-colegas de trabalho da Manutenção do Dmae, desta vez comemorativo ao 59º aniversário do Álvaro. No próximo mês ( em dezembro/2012, se não acabar o mundo!), a Catarina completará o mítico 69 anos de idade e vai entrar na contagem regressiva da aposentadoria compulsória...

Lembro que no dia 30/12/2009 foi o último dia de trabalho do aposentaNdo Jalba, pois ele conquistou a sua liberdade por bom comportamento, após cumprir duas ampliações de pena implementadas por reformas da previdência. 
O colega Álvaro somente naquele mês atingiu o status de Dinossauro com D maiúsculo, ou seja, além de já ter a função gratificada de Diretor incorporada ao salário e ser letra D na progressão final do Plano de Carreira, passou a receber também o Abono Permanência. Significava, portanto, que ele já havia cumprido o tempo de serviço e a idade mínima para se aposentar pelo critério de proporcionalidade, como nós, mas que também ainda não havia conquistado a integralidade e a paridade com o pessoal da ativa. Exceção na sala já era a Catarina que, esbanjando tempo de serviço e de idade, preferiu continuar trabalhando e agora passará a ser perseguida diariamente pelo fantasma da aposentadoria compulsória aos 70 anos.
Na ocasião eu tive a iniciativa de tirarmos uma foto dos quatro colegas de sala reunidos, à qual sugeri dois títulos diferentes: “Os 4 Cavaleiros do Apocalipse na Sala de Extermínio” ou “Os 4 Dinossauros na Sala de Extinção”. A pose da foto  foi montada junto à mesa do Jalba, de modo que aparece ao fundo o quadro pendurado na parede com a foto dos aposentados da Manutenção reunidos na festa de 30 anos da DVM em 1997. Aquela foto no quadro, conforme costumamos brincar, funcionava como uma cartela de bingo, que conforme cada um dos seus 29  aposentados fotografados iam morrendo, marcávamos na cartela do bingo com uma cruz virtual: já se tinha notícia de pelos menos 7  falecidos naquela época, quantos mais terão morrido até hoje? Agora é nós, os quatro dinossauros, que vamos nos tornando a nova cartela de bingo da vez através da foto tirada naquele dezembro de 2009...
Assim, a partir daquela data  começou a se desmantelar uma equipe de engenheiros que cumpriu pena juntos por dez anos, na mesma cela, prestando serviços à comunidade, e por mais de três décadas trabalharam juntas no mesmo presídio semi-aberto de assalariados da empresa de saneamento público portoalegresense. A  mesa em frente à minha passou a ficar vazia, o cara saiu e não voltou nunca mais. A minha cela sofreu a sua primeira defecção definitiva, abriu suas grades para o vôo do sonho de liberdade do Jalba, sonho de simplesmente servir à família e ficar “amando”: a mando dos filhos, a mando dos cachorros da casa e dos pastores da igreja Assembléia de Deus...

Na manhã seguinte, quando entrei na sala e me deparei com a mesa dele definitivamente vazia de sua presença, perguntei com saudosa inveja: Cadê o Jalba?!....Na tarde dequele mesmo dia recebi o seguinte e-mail sarcástico do ex-colega: “Bom dia de TRABALHO! Está em anexo o meu protocolo do pedido de aposentadoria. Não fiques com inveja, tranquilize-se que o teu dia está próximo. sds, Jalba”. Aproveitei para fazer via e-mail uma pergunta que me angustiava, e a Voz do Mestre respondeu:
Olá, caro colega Aposentando!
Você perde o abono permanência a partir do dia do protocolo do processo de pedido de aposentadoria, independentemente se está ou não de licença prêmio ou férias...
Abraço, Jalba.
Após cerca de oito meses em "Licença de Aguardando o Ato", foi decretada a alforria em definitivo do ex-colega Jalba que conquistou a sua  liberdade plena com a publicação do  seu ato de aposentadoria com tudo de bom que se tem por direito (com provento integral e com paridade aos servidores da ativa): o meu sonho de consumo!
-Valeu Mestre Jalba! Quanto aos outros dinossauros da nova cartela do bingo, Catarina e Álvaro, eles não perdem por esperar suas respectivas homenagens mais adiante neste blog...

(Remake de 30/12/2009)


O PEDAGÓGICO SALVE DO PT

A expressão “Salve Geral” ficou popularmente conhecida pela divulgação alarmista da mídia como sendo uma ordem emitida de dentro dos presídios para a bandidagem que está solta executar determinadas ações criminosas de horror-show. O último “salve” que está pegando no país, especialmente em São Paulo, é o de “matança de policiais”, dezenas já foram mortos em execuções relâmpagos.

Enquanto isso, o Salve do PT, emitido pelo comando executivo partidário, por dentro do governo federal, diz que é para o seu povo condenar os “capas pretas” do Supremo Tribunal.  Acusa o STF de fazer política ao coincidir o julgamento com as eleições municipais, e toca o alarme dizendo que a condenação pela suposta compra de votos no Congresso Nacional pode tornar inconstitucional a reforma da previdência que aumentou para 60 anos a idade de aposentadoria. Cá entre nós, saiu barato para o PT, muito mais estragos faria se o julgamento ocorresse na próxima eleição presidencial, onde o tema da ética teria maior repercussão; vamos combinar que os trabalhadores agradeceriam se a reforma da previdência fosse anulada.
O julgamento do Mensalão tem sido pedagógico, uma vez que é feito por juízes majoritariamente indicados pelos réus para o cargo na suprema corte, e que mesmo assim são acusados de lesa-pátria por não transformarem em pizza, como sempre foi feito, justamente o caso de quem lhes deu o emprego vitalício. O aposentaNdo presidente da STF, Ayres Britto, já foi candidato a deputado pelo PT, antes de ser guindado pelo Lula para o cargo de algoz de alguns membros da companheirada  que, deslumbrados pelo poder, se desviaram do caminho da ética que tanto pregávamos no início do partido.
O Salve do PT é pedagógico por se rebelar contra a “teoria do domínio do fato”, adotada no tribunal, segundo a qual quem comanda pode ser responsabilizado por ações que ele não tenha executado pessoalmente. A impossibilidade de desconhecimento do crime é considerada suficiente para a condenação da figura do “mandante” que fica por atrás do serviço sujo, com a ficha limpa.
O pacato cidadão que convive com este jogo de desinformação midiático e governamental, quer é ver o circo pegar fogo. Espera que o julgamento do Mensalão desencadeie um “Salve Geral” de guerra entre as facções dos partidos políticos comprometidos com maracutaias. Quer ver uns denunciando as falcatruas dos outros (PT versus PSDB) no tribunal, agora sobre a presidência do cotista Joaquim Barbosa, para que ele possa sentenciar impiedosamente  os crimes com sua capa de Batman, feito um justiceiro negro investido no poder da toga.
O "Salve-se quem puder" do PT acaba conclamando sua militância para a defesa de sua inocência,  sugerindo que recursos contra as injustiças  condenatórias poderão ser buscados em fóruns internacionais de direitos humanos. Diante de penas financeiras brandas e condenações superiores a dez anos de reclusão, que implicam em necessariamente cumprir prisão de regime fechado, um juiz diz que “Pedagógico não é prender, é recuperar o dinheiro surrupiado dos cofres públicos”, enquanto o Ministro da Justiça declara pedagogicamente que preferiria morrer do que cumprir pena nos calabouços dos presídios medievais brasileiros.
O julgamento, acompanhado em rede nacional quase que diariamente (feito uma telenovela ou bigbrother), tem sido pedagógico por abrir a caixa preta e dar transparência aos procedimentos do rito processual da justiça contra os crimes de colarinho branco. A peça de acusação da Promotoria, a defesa de figurões da política e do sistema financeiro feita por advogados notórios, a longa conclusão do relator e os contrapontos do revisor, os bate-bocas e chiliques entre juízes, as condenações e absolvições de cada caso e a dosimetria das penas...
Tudo muito bonito, mas daí resultar alguém cumprindo pena atrás das grades, feito um ladrão de galinha pé de chinelo, só vendo pra crer. O juiz Barbosinha foi pedagógico ao fazer uma revelação surpreendente, disse que não existe direito à cela especial para portadores de curso superior que tiverem sido condenados, que isso é uma lenda, que a cela especial é prevista só para quem ainda aguarda a sentença final. Como assim?...Sempre me disseram que eu teria cela especial, quer dizer que estudei em vão?...Dizem que todo mundo tem o seu preço, ainda bem que nunca chegaram no meu pra me corromper na minha carreira de servidor público, consegui me aposeNtar a tempo de não ficar com o rabo preso...Ufa!...
15/novembro/2012 – Dia da Proclamação da República
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PLANO CONTRA O TÉDIO NA APOSENTADORIA


           Numa segunda-feira de dezembro de 2009 cheguei no Dmae com cara de sexta. Havia passado as tardes de sábado e domingo fazendo provas do ENEM (Exame Nacional de Ensino Médio), a grande inovação que prometia acabar com os monstruosos concursos vestibulares para as universidades brasileiras.
Assim, meio sem querer-querendo, condicionado pela necessidade de estudar junto com a minha filha que estava batendo às portas da universidade, e motivado pelo fato estar às vésperas de me aposentar e de também estar se esgotando o prazo de validade do meu vestibular anterior, que era de 2003 para Filosofia, enfrentava  novamente a torturante loucura que é fazer uma bateria de provas de vestibular, agora ampliada  da pré-temporada do ENEM.
       Quando resolvi voltar a conquistar uma vaga na UFRGS em 2003, o meu plano era de que estaria  cursando filosofia ao me aposentar e, portanto, estaria devidamente ocupado, espantando de antemão o fantasma da síndrome do tédio, própria dos aposentados recentes. Na época eu estava com 49 anos e pretendia me aposentar aos 53 anos (já pagando o pedágio de 1 ano e cumprindo a idade mínima de 53 anos do FHC,  pois pela lei anterior eu sairia aos 52 anos de idade).
        Por isso em 2010, novamente às vésperas de me aposentar (se nenhuma outra Reforma da Previdência ocorresse como a do Lula que ampliou minha sentença de trabalhos forçados até os 56 anos!), e de também estar às vésperas de ser jubilado da UFRGS por decurso de prazo de validade, vale dizer, ser excluído como aluno de filosofia, ser compulsoriamente defenestrado, resolvi aproveitar para tentar re-editar o plano de 2003 de anti-tédio da aposentadoria, apenas que  buscando então uma vaga no curso de Letras-Espanhol.
        Assim, finalmente entrei na última volta pra bandeirada de chegada pela vitória que define o final do longuíssimo  campeonato do Grande Prêmio da Aposentadoria: 2010 seria o ano da minha alforria dos grilhões da dependência financeira do cartão-ponto! E já não era sem tempo, pois o cartão-ponto através das impressões digitais já estava sendo implantado na empresa, caracterizando ainda mais o sistema carcerário que prevalece nas relações trabalhistas dos assalariados.
        No site da UFRGS conferi ansioso o Listão dos Aprovados no Vestibular 2010: primeiro verifiquei que a minha filha estava no listão (Uau!), e depois que eu também estava (ufa!). Chamar de dupla alegria é pouco, pois a aprovação da guria vale muito, muito mais, não tem múltiplo para quantificar.
       Modéstia à parte, com este de 2010 é o quinto vestibular que consigo aprovação na UFRGS. Primeiro foi em Engenharia de Minas (1979), curso escolhido ao acaso por apresentar maior facilidade de acesso dentro das engenharias, com o objetivo de fazer o ciclo de disciplinas básicas. Casualmente o segundo foi justamente em Letras (1981)  em que eu pretendia estudar uma língua estrangeira, em um segundo curso (na época era permitido frenquentar dois cursos!), mas no qual nem me matriculei quando soube que as aulas eram lá no Campos do Vale (motivo banal: eu não tinha carro!). 
    O terceiro vestibular foi para Engenharia Elétrica em 1984, faculdade que era desde o início o meu projeto profissional, já que havia feito o curso técnico de eletrônica no Parobé. Mas acabei me desiludindo com o curso e retornei, em 1988, para o curso de Engenharia de Minas, que estava trancado, o qual se revelou muito bom de ser cursado pelos seus fundamentos geológicos. Assim, finalmente consegui me formar como engenheiro de minas em 1991, treze anos após ter ingressado na faculdade, atraso que é devido ao fato de coincidir com este período o meu intenso envolvimento com a militância política, sindical e partidária.
           Desta última vez decidi ouvir a voz da minha própria experiência  e assumir que a coisa que eu mais gostei de fazer durante toda a minha vida foi escrever. Como escrever é literatura, logo o curso é Letras! Pelo aristotélico silogismo filosófico concluo, com fundamentos lógicos, que já sei o que quero ser quando crescer: escritor.
O evento festivo da matrícula no curso de Letras  tem o seu lado melancólico, é que encerrou-se ali o meu ciclo de estudos filosóficos, e o corte deste cordão umbilical acadêmico com a filosofia deixou uma espécie de sensação de vazio no  meu peito, após o rompimento irreversível com este curso que tanto contribuiu para fundamentar de modo consistente o aspecto filosófico da vida na minha formação pessoal. Talvez o vazio se deva ao fato que agora não alimento as mesmas expectativas e carências vitais em relação ao curso de Letras do que alimentava quando iniciei na filosofia. Tomara que eu seja surpreendido e que esta licenciatura se revele tão boa de ser cursada como se revelou o curso de Engenharia de Minas, em que eu não botava a mínima fé (graças ao qual ganhei o meu sustento e que está me propiciando um  bom gozo na minha aposentadoria).
Portanto, viva 2010 (e 2011, quando de fato me aposentei)! Viva 2012, antes que se confirmem as profecias de final dos tempos no mês que vem, em dezembro, quando haverá  o alinhamento completo de todos os planetas do sistema solar com o centro da Via Láctea (fato confirmado e que ocorre a cada 26.000 anos, que estava previsto no calendário Maia desenvolvido há cerca de 3 mil anos atrás),  e que as profecias interpretam como o Fim do Mundo (inclusive as do I Ching chinês). Dizem que até Nostradamus achava que a Terra perderia seu movimento natural de rotação, podendo se inverter...Viva o hoje!
 ( Remake de 7/dezembro/2009 e 28/janeiro/2010)




O NOVO VELHINHO DA FEIRA DO LIVRO

          Perambular por horas, de banca em banca, até a exaustão física e mental, sem deixar escapar nenhuma alameda da praça da Alfândega,  é  um ritual quase religioso que praticava anualmente desde jovem, na procissão literária com cada vez maior número de fiéis na Feira do Livro. Houve tempo em que vasculhava livro por livro em cada um dos balaios de ofertas, como quem procura pepitas preciosas dos clássicos da literatura em edições antigas, barateadas pelo amarelado do papel com cheiro de mofo e roído de traças. Eu tinha todo o tempo pela frente para ler...
          Na última década, já “cinquentão”, não deixei de marcar presença em todas as edições da feira, mas fui ficando cada vez mais seletivo. Já não visitava a Feira do Livro em vários dias, como antigamente, e tampouco rastreava minuciosamente os balaios de saldos, apenas dava uma visualizada geral assim como nas capas e títulos dos livros expostos nos balcões das bancas. Não fazia mais questão de percorrer todas as alamedas, preferia ir diretamente para as seções de meu maior interesse momentâneo nas bancas das livrarias especializadas nos assuntos:jornalismo, filosofia, espanhol, literatura, etc.
         Agora, às vésperas de ser um “sessentão”, começa a ficar demasiadamente cansativo perambular por horas, de banca em banca, e a exaustão física e mental com a aglomeração e o calor está ficando cada vez mais precoce. Começa a me parecer estranho olhar centenas (ou será milhares?) de capas de livros, lendo automaticamente seus títulos, até que algum mobilize a mão para pegá-lo, abrir e ler parte da orelha...
A verdade é que já não tenho mais tanto tempo pela frente para ler,  e a demanda reprimida de livros que “preciso muito ler” constituem uma lista tão grande que começo a pensar  que não vou dar conta nesta existência. Avalio que ocorrem dois agravantes que dificultam a realização do meu rol de leituras essenciais, um é que sempre surgem novas demandas contemporâneas que furam a fila dos cânones, e o outro problema é que sempre acabo priorizando escrever em detrimento de ler. No momento estou lendo Antologia General de Pablo Neruda, Contos Reunidos de Moacyr Scliar e Ulisses de James Joyce; isso nos raros momentos entre um escrito e outro que vão brotando inesperadamente. Que cachaça!
           Talvez este meu desencanto com as  auras de magias  que a Feira do Livro ostentava no meu imaginário seja uma coisa momentânea, um estado de espírito depressivo decorrente do episódio que ocorreu no ônibus em que me dirigia para o centro da cidade para chegar na feira. Passageiro com pouca prática de andar de ônibus em pé, fiquei meio atrapalhado e cambaleante para pagar a passagem e guardar o troco na carteira, quando uma mulher jovem, cheia de livros e pastas no braço, levantou com determinação e ofereceu o seu lugar para este ostensivo velhinho (eu) sentar: a primeira vez a gente nunca esquece!